Lições do
passado.
Recentemente, depois de ler um de meus textos, um amigo disse-me que eu tinha um estilo parecido
com o do meu pai. Especialmente no que diz respeito à linguagem simples e
direta. Não foi a primeira vez que me disseram isto. Nem é preciso dizer que
fiquei demasiadamente feliz com a grata comparação.
De meu pai tive um aprendizado muito
grande. Desde garoto me acostumei a ler e gostar do que ele escrevia. E tem um detalhe
importante: como aprendiz e tipógrafo, eu fazia questão de compor os textos por
ele escritos, juntando no componedor os tipos de chumbo para edição do jornal
“A Semana”. Foi um treinamento valioso para minha formação.
Lembro-me, agora, de uma das mais gratas
lições do meu pai. Estava certa tarde na sala da frente da redação do jornal,
lendo um gibi. Meu pai aproximou-se, olhou o que eu estava lendo, foi até uma
de suas estantes, pegou um livro e me disse: “Se você quer conhecer boas
histórias, leia este livro”. Era um dos
exemplares de sua coleção do escritor Malba Tahan, com o título “Lendas do céu
e da terra”. Fiquei encantando com a leitura do primeiro livro. Daí em diante eu
comecei a ser um assíduo leitor e admirador do autor de “O Homem que Calculava”; passei também a conhecer os encantos da biblioteca de meu pai.
Tempos depois, no final dos anos
cinquenta, quando eu era aluno interno do Ginásio Jackson de Figueiredo, voltei
a lembrar da lição de meu pai. O diretor Benedito Oliveira designou-me a
comparecer ao Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe para assistir à
palestra “A arte de contar história”, proferida pelo professor catedrático do
Colégio Pedro II, do Rio de Janeiro, Júlio Cesar de Mello e Souza, que era mais
conhecido pelo pseudônimo Malba Tahan, que usava ao escrever suas famosas
histórias.
Para mim foi uma satisfação imensa e, até hoje, não
esqueço uma parte da explanação do grande escritor, na qual ele dizia que o
simples fato da saber escrever não era suficiente para ser um bom contador de
história. E apresentou um exemplo que ficou inculcado em minha memória. Tentarei passar para os amigos o que ouvi do
grande Malba Tahan.
Dizia ele que um garoto estudante, que vivia na
roça, aproximou-se do pai e perguntou o que significava o vocábulo “FENÔMENO”, termo
que a professora pedira para ele descrever como dever de casa. O pai não era
letrado, mas sabia das coisas e tinha sua maneira própria de se fazer entender.
Então, pensou um pouco, olhou para o filho e disse:
- Está vendo
esta vaca? E antes que o filho dissesse qualquer coisa, ele completou: “Ela não é um fenômeno”.
- Está vendo aquela
casa? E acrescentou: “Ela também não é um fenômeno”
E ante o olhar interrogativo do filho, concluiu:
- Mas, quando
você notar que esta vaca subiu no telhado daquela casa, aí meu filho, você
estará diante de uma raridade, uma coisa fora do comum: um FENÔMENO. E fatos como este serão merecedores de admiração porque se incluem entre os que têm natureza fenomenal.
Ao finalizar, o conferencista fez uma explanação
sobre a importância do uso da simplicidade na forma de contar histórias.
...
Ainda aproveitando o gancho deste causo, veio-me à lembrança
um fato que ocorreu quando eu trabalhava no Banco do Nordeste e participava na
Direção Geral, em Fortaleza, de um treinamento para elaborar apostilhas sobre
ensino à distância (no meu caso: Crédito Rural). O Banco contratara uma
professora paulista para nos ensinar. Na primeira aula, ela fez
uma preleção sobre a necessidade de usarmos uma linguagem simples, de modo a facilitar
o entendimento. Aproveitei a oportunidade e narrei o exemplo que nos foi ensinado
pelo famoso Malba Tahan.
Depois que contei o caso, um colega desatento
perguntou qual o sentido daquele fato para o treinamento. Fiquei triste e atordoado
diante daquela pergunta, isto porque deu a entender que a minha narrativa tinha
sido impertinente.
Recuperei-me ao ouvir a professora paulista
esclarecer a pertinência de minha intervenção, e o fez usando exemplo simples,
tal qual o ensinamento do mestre do Colégio Pedro II.
São lições inesquecíveis de pessoas que enriqueceram
nosso conhecimento.
Aracaju, 11/07/2016
BETO DÉDA
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