quarta-feira, 11 de julho de 2018


A desmoralização do HABEAS CORPUS pelo próprio judiciário.


No último domingo a Nação brasileira presenciou mais uma vez o descalabro que vem sofrendo o judiciário, diante da postura de alguns representantes daquele importante poder da república.

O que se viu parecia inacreditável. A desmoralização de importante instituto jurídico patrocinada por um grupo do próprio poder judiciário. O ato do infausto grupelho elevou ao cume o descrédito que na atualidade atinge a nossa justiça. 

Juízes que se acham donos da verdade, que extrapolam suas prerrogativas, que pensam serem os eternos senhores dos processos, que não escondem preferências, que se dizem assoberbados e rejeitam ações envolvendo grupos que lhe são simpáticos, mas que não vacilam – mesmo depois de esgotada sua participação em lides – em ocupar momentos de suas férias para fragilizarem o mais importante remédio constitucional destinado a amparar a liberdade dos indivíduos: o instituto do Habeas Corpus.

Sem competência para a absurda atuação, juízes mantiveram contatos com policiais federais envolvidos/coniventes e sustaram, pelo tempo que acharam conveniente, o cumprimento de ordem judicial (no jargão jurídico conhecido como writ) emanada de autoridade superior (desembargador em exercício de plantão, representando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Absurdo e escândalo maior parece não ter sido presenciado neste nosso Brasil de tantas injustiças. O domingo, 08 de julho, será lembrado como o dia de horrores para o judiciário pátrio.

A expressão latina Habeas Corpus significa: que tenhas o teu corpo. No linguajar do direito tem o sentido de um instituto que cuida da liberdade individual; o direito de ir e vir. Este recurso jurídico teve sua  origem na Inglaterra, no ano de 1215, na “MAGNA CHARTA LIBERTATUM” outorgada por João Sem Terra à nação inglesa.  

Em nosso Brasil - Brasil com S(esse) -  o instituto do Habeas Corpus sempre foi respeitado; mesmo por aqueles que por meio da força das armas conquistaram o poder.

Para os mais novos, relembro aqui um fato importante ocorrido no final do ano de 1964, quando, em consequência de um golpe, o país era governado pelo poder das armas dos militares.

Naquela época, o Supremo Tribunal Federal – atendendo petição do advogado Sobral Pinto – concedeu Habeas Corpus ao governador de Goiás, Sr. Mauro Borges, que era opositor e vítima do governo militar. O fato foi considerado como uma bomba estourada nos meios políticos e gerou uma intensa preocupação para a nação, que antevia uma grave ameaça à independência dos Poderes da República.

Mas, afinal, o Habeas Corpus foi respeitado e a harmonia entre os poderes foi aparentemente preservada.  Os militares tiveram que engolir seco e utilizar outros meios (considerados arbitrários e contra o povo de Goiás) para defenestrar Mauro Borges do Governo daquele Estado.

Charge publicada no jornal "A Semana",
edição de 04/11/1964
O fato foi registrado no jornal “A Semana”, de Simão Dias, na edição de 04/11/1964, em uma charge de autoria do meu pai (Carvalho Déda) que mostrava a força do Habeas Corpus contra a espada do poder militar.

Nos dias atuais, por incrível que pareça, foram membros do próprio judiciário que ousaram desmoralizar o remédio constitucional de proteção ao indivíduo.

Se estivesse entre nós, diante do escândalo de domingo, certamente meu pai teria esculpido na madeira uma charge inimaginável para aquela época: a figura que representa a justiça – livrando um olho da venda que lhe cobre a visão e empunhando uma balança pesada, bruta, desequilibrada, com o fiel pendente para a direita – esmagando o instituto do Habeas Corpus.

Densas e pavorosas nuvens pairam sobre nosso país.

Aracaju, 11/07/2018
BETO DÉDA