“DEIXA O LENÇO
CAIR” E OS CARTÕES DE CUPIDO...
Na minha mocidade, em
Simão Dias, havia um sentido romântico quando uma garota “deixava cair o
lenço”. Era um gesto indicativo de que a mocinha dava uma chance para o moço
continuar seus galanteios. Trocando em miúdos: quando a moça deixava cair o
lenço dava uma brecha para o admirador continuar a cantada ou paquera. Na
verdade era um reflexo do que se via em filmes de amor e em romances
literários, muito lidos pela juventude da época.
O caso do lenço foi-me
despertado ao ouvir a canção “Tua Cantiga”, do genial Chico Buarque, que contém
os seguintes versos:
“Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar”
O
certo é que ao ouvir o álbum “Caravanas” do Chico, relembrei fatos idílicos dos
bons tempos em que, nas tardinhas dos dias de domingo, a calçada que circunda a
Matriz de Santana era o tapete de desfile de lindas, queridas e saudosas
garotas de minha terra.
As
mocinhas de braços dados, em grupos de duas ou três, passeavam em volta da
igreja e, perfilados junto ao meio-fio da calçada, ficávamos admirados com a
beleza que elas irradiavam. E não faltavam os galanteios e os olhares furtivos
e cativantes. Então, quando uma menina “deixava o lenço cair” a paquera se
estendia com troca de frases sentimentais de pensadores ilustres, lidas e decoradas de
almanaques e de folhinhas de calendário.
Era
assim, no passeio da Praça Barão de Santa Rosa de minha terra, que muitos jovens simãodienses inciavam namoros que, depois, se transformaram em firmes e felizes casamentos.
Na
impossibilidade de literalmente “deixar cair o lenço”, muitos romances foram
iniciados com o uso de um cartão – “cartão do cupido” – que eu imprimia nas
oficinas do jornal “A Semana” e vendia para os colegas inibidos oferecerem às
jovens preferidas, no passeio da praça.

Não
é demais dizer que, como bom comerciante, eu sempre aconselhava aos compradores
sobre o óbvio: o cartão só podia ser usado uma vez! Vendia muito e tinha alguns
bons fregueses, justamente os que não se saíam bem na abordagem romântica.
O
certo e prazeroso é que o cartão foi um sucesso e alguns namoros por ele
iniciados também se consolidaram em casamentos felizes.
Bons
e inocentes tempos.
ARACAJU, 21/11/2017
BETO DÉDA