terça-feira, 21 de novembro de 2017


“DEIXA O LENÇO CAIR” E OS CARTÕES DE CUPIDO...

Na minha mocidade, em Simão Dias, havia um sentido romântico quando uma garota “deixava cair o lenço”. Era um gesto indicativo de que a mocinha dava uma chance para o moço continuar seus galanteios. Trocando em miúdos: quando a moça deixava cair o lenço dava uma brecha para o admirador continuar a cantada ou paquera. Na verdade era um reflexo do que se via em filmes de amor e em romances literários, muito lidos pela juventude da época.

O caso do lenço foi-me despertado ao ouvir a canção “Tua Cantiga”, do genial Chico Buarque, que contém os seguintes versos:

“Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar”

O certo é que ao ouvir o álbum “Caravanas” do Chico, relembrei fatos idílicos dos bons tempos em que, nas tardinhas dos dias de domingo, a calçada que circunda a Matriz de Santana era o tapete de desfile de lindas, queridas e saudosas garotas de minha terra.

As mocinhas de braços dados, em grupos de duas ou três, passeavam em volta da igreja e, perfilados junto ao meio-fio da calçada, ficávamos admirados com a beleza que elas irradiavam. E não faltavam os galanteios e os olhares furtivos e cativantes. Então, quando uma menina “deixava o lenço cair” a paquera se estendia com troca de frases sentimentais de  pensadores ilustres, lidas e decoradas de almanaques e de folhinhas de calendário.

Era assim, no passeio da Praça Barão de Santa Rosa de minha terra, que muitos jovens simãodienses  inciavam namoros que, depois, se transformaram em firmes e felizes casamentos.

Na impossibilidade de literalmente “deixar cair o lenço”, muitos romances foram iniciados com o uso de um cartão – “cartão do cupido” – que eu imprimia nas oficinas do jornal “A Semana” e vendia para os colegas inibidos oferecerem às jovens preferidas, no passeio da praça.

O cartão tinha frases cafonas declarando amor e as seguintes palavras em cada canto: SIM, NÃO, TALVEZ e NUNCA. Era só entregar o cartão à garota escolhida e pedir que ela dobrasse no canto que tivesse a palavra que lhe conviesse e devolvesse.


Não é demais dizer que, como bom comerciante, eu sempre aconselhava aos compradores sobre o óbvio: o cartão só podia ser usado uma vez! Vendia muito e tinha alguns bons fregueses, justamente os que não se saíam bem na abordagem romântica.

O certo e prazeroso é que o cartão foi um sucesso e alguns namoros por ele iniciados também se consolidaram em casamentos felizes.

Bons e inocentes tempos.

ARACAJU, 21/11/2017

BETO DÉDA

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