Maria de Oliveira Déda (D.
Sinhazinha Déda).
O dia 09 de abril é uma
data importante para a família Oliveira Déda. Foi em 09 de abril de 1903 que
nasceu – no engenho Vazaringui, em Riachuelo (SE) – a minha querida e saudosa
mãe Maria Accioly de Oliveira, conhecida como Sinhazinha Oliveira, filha de
Francisco José de Oliveira e Adele Accioly Oliveira.
Na segunda década do
século passado, quando vovó Adele ficou viúva, levou a família para morar em
Simão Dias. A viagem foi em carros-de-bois, e a família era constituída pelos filhos:
Tarcísio José de Oliveira, Zeca Oliveira, Ester Amélia de Oliveira, Amereciana
Oliveira e, a sobrinha/filha de criação, Eunice Barbosa de Oliveira.
Na sua juventude em Simão
Dias, ela se destacou por seu interesse em participar de trabalhos comunitários
e em ajudar ao próximo. Junto com outras jovens da cidade acompanhava o
movimento feminista que começava a se propagar pelo país. Tinha um formidável
conhecimento e gosto pela leitura. Uma das imagens que tenho é quando ela se
sentava na varanda de nossa casa para leitura de algum livro. Certa vez ouvi
ela comentando com minha irmã Nancy sobre o livro “Vidas Perdidas”, do grande
simãodiense Carvalho Neto. Como resultado dessa recordação, já adulto, eu tive
a oportunidade de ler o referido livro na biblioteca Epifânio Dória, aqui em
Aracaju.
Sua atuação nos eventos
públicos foi notícia em publicações do jornal A Luta, que era
editado por Emílio Rocha. Veja abaixo nota de participação de D. Sinhazinha em
evento comunitário divulgado pelo referido jornal, em 14.09.1923:
Recortes do jornal “A Luta”, editado em Simão Dias, com foto e menção a Sinhazinha Oliveira
Anos depois, casou-se com
o jornalista José de Carvalho Déda, passando a adotar o nome de MARIA DE OLIVEIRA DÉDA (era
conhecida como D. Sinhazinha Déda).
Desse consórcio nasceram 8 filhos: Zilda Déda Chagas (mãe do governador Marcelo
Déda Chagas), Nanci Déda Oliveira, Artur Oscar de Oliveira Deda, Maura Oliveira
Déda, Helena Déda Aquino, Carlos Eugênio de Oliveira Déda, Carlos Alberto de
Oliveira Déda e Maria Eugênia Déda Lima.
Maria Oliveira Déda e seu esposo José de Carvalho Déda -1934 (foto acervo Beto Déda)
Em 1932, com o Decreto
21.076, do então presidente Getúlio Vargas, as mulheres brasileiras conquistaram o direito de votar. Assim
é que, em 07 de abril de 1933, no afã de participar como eleitora, ela tirou
seu título eleitoral:
Título de Eleitor de D. Sinhazinha Déda (acervo Beto Déda).
Sinhazinha Déda -1950 – (Foto
acervo Beto Déda)
Ela tinha sido professora
e sabia nos ensinar, especialmente no que diz respeito à redação e
interpretação de textos. Em 1965, quando eu fiz o concurso para ingressar no
Banco do Nordeste, comentei com ela sobre o tema da redação e ela me abraçou,
afirmando que eu tinha interpretado bem o assunto e aguardasse com otimismo o
resultado. Não deu outra: comemoramos alegres a minha aprovação entre os dez
primeiros lugares.
Em nossa memória ficaram
gravados, mesmo com o passar dos anos, os ensinamentos recebidos da querida Mãe
Sinhazinha, como era chamada pelos netos. Em presença dos filhos e netos, ela faleceu
em Aracaju, em 30/07/1988, e seu sepultamento ocorreu no Cemitério São João
Batista, em Simão Dias.
Sua santa bondade, e seus
ensinamentos perduram eternamente. Já escrevi sobre isto e vale aqui repetir
para todos seus descendentes, na data que homenageamos o seu nascimento.
Lembro-me agora, com saudade, de minha querida mãe embalando-me em seu colo, consolando-me de um dos meus choros inconsequentes. Eu já tinha noção da vida. Então, ela comentava que não entendia aquela minha reação efusiva em lágrimas. Argumentava que aquele procedimento não se ajustava ao que acontecera na manhã chuvosa daquele domingo do mês de maio, quando eu vim a “este vale de lágrimas”. E contava-me os detalhes. Eu nascera sem demonstrar sinal de vida. A simples palmada na bunda não me fizera chorar. Aflito com aquela situação, meu pai resolveu fazer ruído junto ao meu ouvido, batendo com um garfo em um prato, para me despertar. Foi o santo remédio, dizia ela, lembrando que eu abri os olhinhos pretos e comecei a chorar. Com esse precedente, argumentava ela, esperava-se que eu fosse um garoto resistente ao choro. Assim, não dava pra se entender porque eu sempre estava me esvaindo em prantos.
A verdade é que a
minha reação retardada no dia do nascimento foi compensada depois, porque
passei a chorar compulsivamente diante de qualquer dificuldade. De tal forma
era meu choramingar que sempre estava sendo repreendido por meus pais. E fui
sendo educado a controlar minhas emoções. Lembro-me, como se fosse hoje, o dia
em que vendo minha mãe tentando consolar meu choro, meu pai disse-lhe: “Deixa
chorar, é bom para os pulmões!”. Ela fitou-me com ternura e disse
baixinho: “Larga esse choro filho, ou chorarei com você...” Senti
profundamente o sentido de suas benditas palavras e, com as costas da mão, limpei
as lágrimas. Só voltei a chorar copiosamente muito tempo depois, quando meu pai
e ela partiram para outra dimensão da vida...
No livro de sua autoria (
História
de Vários Tempos), meu saudoso irmão Artur Oscar de Oliveira Déda
menciona lições recebidas de nossa mãe. Vejamos:
“ Aracaju em três tempos (páginas 29/30)”
“Eu gostava muito de ouvir as
lembranças de minha mãe. Do seu tempo de menina em Riachuelo, no engenho
Vazaringui pertencente a
meus avós. Comprazo-me ainda hoje com essas recordações. Gostava principalmente
da narrativa de viagens fluviais a Aracaju, numa lancha bem fechada, singrando
o rio velozmente deixando escumas brancas por trás. A representação mental que
eu fazia do objeto descrito absolutamente não correspondia à realidade
conhecida muito tempo depois. E o rio que eu conhecia era o Caiçá, uma corrente
de águas baixas, em certos pontos não mais que um filete escorregando
suavemente sobre seixos pequeninos. A imaginação do ouvinte tornava a história
emocionante. E ainda mais fascinante era a descrição do mar. Para facilitar o entendimento
da criança curiosa, a narradora inteligente valia-se de uma metáfora: “Um Tanque-Novo
sem fim!!!”.
...
“A quem pertence os
frutos pendentes (páginas 227/229):
“Agora... lembrança me traz saudade de uma pessoa que tanto me influiu na
formação da minha consciência, pelo espírito sereno e alma bondosa. Mãe mestra.
Eu devia ter oito anos. Talvez um pouco mais, talvez um pouco menos. Sei que
não era muito diferente dos outros de minha infância. Lembro-me, contudo, que
revelei precocidade numa definição. Não propriamente perlo acerto da decisão
tomada, mas pela capacidade de decidir. Manifestei-me resoluto diante do mesmo
problema que, tantos anos depois, o professor não contribuiu para solucionar: o
fruto da árvore vizinha, pendente pelo ramo que avançou para além do muro
divisório dos nossos quintais, dele eu era legítimo dono. Não tinha dúvida e
apetite não me faltava.
A árvore era uma romãzeira viçosa e o
seu fruto delicioso. Para mim, na verdade, apetitoso mais pela aparência do que
pelo sabor dos bagos refrescantes. (...)
Para exercício do meu pretenso
direito de fruição, opunha-se o sério problema da altura. Tive que praticar
estripulia. Numa engenharia improvisada, arquitetei uma geringonça formada por
uma cadeira velha e sarrafos justapostos. Mesmo sem estabilidade, alcancei a
meta, segurando o fruto. Mas a construção balançou; balançou forte.
Desequilibrei-me. Entretanto, consegui girar para o lado mais favorável,
aliviando a queda. Nada sofri. O que demonstra, pelo menos em parte, a razão do
provérbio: “Ao menino e ao borracho, põe-lhes Deus a mão por baixo.” A
barulheira do desabamento chamou a atenção de minha mãe, que prontamente
acudiu, flagrando-me na “posse direta” da romã da vizinha, pessoa de seu afeto.
Para ela, o problema não era nada jurídico, pois que ético, exclusivamente.
Levou-me à presença da amiga. D. Conceição sorriu mansamente, recebeu a fruta e
me devolveu logo. Magoado e choroso, olhei pra minha mãe, que consentiu. Hoje
fico pensando como uma pessoa tão compassiva pudesse me dar tão dura lição! Quando
voltamos, ela passava o dorso da mão sobre os olhos e, antes de entrar no
quarto para recompor-se, liberou-me dos afazeres daquele dia.
O certo é que a lição de moral do
passado viria a valer muitas vezes mais que a conferência jurídica do futuro.”
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Estas são lembranças que enriquecem o passar de pessoas inesquecíveis em nossa
caminhada. Nos encantamos e revigoramos com estas lembranças. E, aqui para nós,
não importo de dizer que os olhos marejam de saudade e alegria, um choro forte
mesmo, com mistura do meu tempo de criança e de idoso, com soluço e riso, por
comemorar a data que simboliza o dia do nascimento de minha mãezinha Sinhazinha Déda.
Aracaju, 09 de abril de 2024
Beto Déda