Meu primeiro dia como bancário.
As lembranças que me acodem neste domingo se referem a fatos que
ocorreram há 53 anos, quando eu era servidor do Estado de Sergipe e aluno da
Faculdade de Ciências Econômicas.
No início de 1965 tomei conhecimento que o Banco do Nordeste do Brasil
(BNB) estava programando concurso em todo nordeste para ampliar seu quadro de
funcionários.
Fui aprovado entre os primeiros e imediatamente convocado para tomar
posse na agência de Simão Dias, minha terra natal. Pedi exoneração do cargo que
exercia no Governo do Estado (na ocasião eu era Oficial de Gabinete do
Governador Celso Carvalho) e fui me tornar um benebeano (assim eram chamados os
funcionários do BNB).
Minha posse ocorreu no dia 16 de junho de 1965, ocasião em que os saudosos
amigos José Carlos Macedo Déda (meu querido primo) e José Augusto Montalvão,
que ali trabalhavam, me pregaram uma peça, ou melhor, um
alegre trote para me recepcionarem.
Mandaram-me perfilar como um recruta e depois, cerimoniosamente,
disseram que eu devia assinar outra "importante" folha de presença.
Peguei a caneta e, sem perceber o que ali estava escrito, assinei com
indisfarçável alegria. Eles também rubricaram como se estivessem atestando
minha presença. Em seguida, pronunciaram algumas palavras, em tom de discurso.
Não obstante a emoção do momento, o palavreado me pareceu estranho. Ao
perceberem o movimento de minhas sobrancelhas, expressando perplexidade,
sorriram bastante e esclareceram a gozação: mostraram-me a tal folha de
presença, na qual se destacava no frontispício que se tratava de uma “Folha
Suplementar do Setor Avacalhado”.
Ainda hoje
conservo em meus arquivos o original desta folha de presença. E quando a vejo
não consigo disfarçar o riso e a saudade daqueles colegas.
...
![]() |
Beto (de gravata) entrega placa em homenagem a Montalvão pela aposentadoria. |
O
interessante é que, muitos anos depois, em outubro de 1987, na Agência
Metro-Aracaju, em nome dos colegas, prestei uma homenagem ao amigo José Augusto
Montalvão, no dia de sua aposentadoria. Foi uma cerimônia bonita, e eu tive a
oportunidade de dizer algumas palavras, inclusive lembrando o dia em que ele e
meu primo Zé Carlos Déda participaram de minha posse no Banco. Uma coincidência formidável. Fui recepcionado
por Montalvão no meu primeiro dia de trabalho e, muitos anos depois, o
homenageei na sua despedida.
...
Mas, antes
de concluir, resta ainda uma lembrança do meu primeiro dia como bancário. Na
mesa do café da manhã, meu saudoso pai indagou-me como daria continuidade aos
meus estudos. Tentei tranquilizá-lo e prometi que continuaria o curso de
Ciências Econômicas. Informei que já tinha conversado com os professores e eles
reconheceram que as faltas eram justificáveis; não seria motivo de reprovação.
Eu teria que estudar os assuntos abordados em aula e participar das provas.
Passei
a frequentar a faculdade apenas nas noites das sextas-feiras, quando me
inteirava da matéria lecionada, assistia às aulas daquelas noites e participava
das provas no final do mês.
Como não contávamos com as marinetes para
Aracaju no período da tarde, então eu viajava nas sextas-feiras no caminhão
do Seu Val, que transportava carne do sol para esta capital.
Se não surgissem passageiros especiais, o Sr. Val permitia que eu viajasse na
boleia do caminhão. Mas o normal era meu lugar na carroceria, sentado em cima
da carne salgada. Ainda passei cerca de um ano e meio fazendo esse percurso de
aventuras.
Antes de encerrar esta narrativa, fico
aqui a matutar com meus botões que certamente o leitor perguntará, com absoluta
razão:
- Pera aí, cara! E a promessa que fizeste
ao teu pai?
Então eu respondo que levei um longo tempo
para cumprir. Com o passar dos anos, esqueci o desejo que tinha de cursar
Engenharia na Escola Politécnica da Bahia e Ciências Econômicas aqui em Aracaju.
No entanto, jamais olvidei a promessa que fiz ao meu pai e, também, nunca
esqueci sua preferência pelo curso de Direito.
O fato é que, muitos anos depois, eu
continuei os estudos e me formei como bacharel na Faculdade de Direito da
UNIT e passei a exercer a advocacia, tal como meu pai e mestre me aconselhara. Pena é que a minha alegria não contou com sua presença, porque muito tempo antes ele já tinha passado para a vida eterna.
Por razões óbvias, no caso que agora relembro não cabe qualquer justificativa para o prolongado tempo de cumprimento. Para mim ficou mais uma lição importante: promessa
é dívida e deve ser paga com oportuna brevidade...
Aracaju, 03 de junho de 2018.
Beto Déda