A Escandalosa
e seu jeito de tudo resolver
Conheci uma
garota em minha terra que era uma graça. Fugia aos padrões das demais meninas.
Era conhecida como Escandalosa e tinha livre pensamento. Sem papas na língua,
sem amarras; sabia expandir os limites de seus sonhos e desejos.
Indaguei certa
vez se não se preocupava com o que os outros pensavam do que ela dizia e fazia.
Respondeu-me, balançando a cabeça de lado, como se fizesse desdém: “Ora bolas! Os outros que se f... Faço o que
bem entendo...
Quando queria satisfazer
um desejo, não vacilava. Fazia. Se pensava em alegrar alguém, dando alguma
coisa, não esperava o pedido. Oferecia, sem constrangimento, com um simples: “Quer? Tome...” E a oferta incluía até
aquilo que não se fala junto aos castos...

No ritmo do
arranjo que tocava os frevos pernambucanos do mestre Capiba, enquanto dava os
passos mostrando as coxas com salpicos de confete, Escandalosa aproximou-se e
indagou maliciosa: “Querem? Tomem...” E rebolou a popança em nossa frente, bem
juntinho, fustigando-nos. Ficamos boquiabertos com tal desfaçada oferta.

Na
verdade o seu insucesso era consequência do pouco atrativo devido a ação voraz
dos janeiros, que lhe subtraíram a capacidade de atrair. Mas ela não se dava
por vencida.
Lembro-me agora e, embora não possa confirmar o fato, repasso para os amigos a força persuasiva
de Escandalosa, conforme me fora contado pelo conterrâneo Serafim. Devo
esclarecer que nos velhos tempos, o Serafim participava das brincadeiras na
Praça de São João, onde ele costumava comer tanajuras torradas, igual ao que os
ricaços fazem nos melhores restaurantes de Nova Iorque. Para mim, Serafim sempre
será o maior repentista que conheci. Suas conversas eram versejadas. Quando eu
mencionava seu nome, ele repetia com rima:
“Serafim, Serafim! Cuide de você que eu
cuido de mim. E se quiser saber das coisas eu conto do começo ao fim...”
Pois
bem. Dizia-me o Serafim que a Escandalosa ao se tornar coroa, sem contar com as
vantagens que a mocidade lhe concedera, apaixonou-se por um mancebo, que morava
lá pelas bandas do Bonfim, em direção ao campo de aviação. O moço não lhe dava
bolas.
Escandalosa
não se desanimou. Foi à luta. Em determinada tarde, ela embelezou-se com
capricho e partiu para a conquista. Pacientemente, foi esperar o afeiçoado, lá na estrada perto do posto fiscal. Quando avistou o benquisto, exclamou aos berros:
“Socorro!
Este moço quer me agarrar a pulso. Me acudam...”
Surpreso
com tal disparate, o sujeito se defendeu, dizendo que era impossível tal
agressão. E justificou:
“Senhora, mesmo que estivesse interessado,
não é possível, não vê que estou com as mãos ocupadas, com um chuço, um bode,
uma perua e um tacho...”
E
a Escandalosa, para encerrar a conversa, deu um jeito, dizendo maliciosa e,
como sempre, insinuante:
“Você querendo, bem pode:
Finca o chuço e amarra o bode;
Emborca o tacho...
Bota a perua debaixo!...”
Aí
não teve jeito, o moço fincou o chuço...
Aracaju, 26/11/2015
Beto Déda