terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Mas afinal, quem era o intelectual “Simeon de Sá Bazu”?

Nesta semana andei lá pelo centro da cidade e, passando pela Praça Fausto Cardoso, lembrei-me do tempo que fui redator da Secretaria de Imprensa no Governo do Dr. Celso Carvalho, que era meu conterrâneo e padrinho. A Secretaria ficava no Palácio Olímpio Campos, em uma sala em frente ao Gabinete do Governador.  Os trabalhos de redação e divulgação eram comandados por um funcionário público que redigia bem, sabia discursar e, como era versado em ritos cerimoniais dos governos, também organizava os atos públicos em que o governador participava.
Lembro-me muito bem que o dito servidor era gordo, tinha uma barriga avantajada e um bigodinho que lembravam o Sargento Garcia dos filmes de Zorro. Mas, à boca miúda, a galera aplicava-lhe apelidos engraçados, alguns inconvenientes, realçando sua grande pança; outros evidenciavam que seu interesse estava mais ligado ao palácio do que aos governantes, atribuindo-lhe o apelido de “Gato de Palácio”.
A verdade é que ao redator-chefe tinha uma verve fantástica e sabia muito bem usá-la nos atos em que lhe permitiam a palavra. Gostava de discursar e, muitas vezes, mesmo estando sozinho em seu gabinete, ouvíamos seus brados inflamados, algumas vezes a verberar contra pessoas que fugiam de seu agrado, usando impropérios, acusando-os de comunistas.
Certa vez tive um desentendimento forte com o chefe de redação. Tudo porque eu usava as horas vagas para escrever artigos que eram publicados no jornal “A Semana”, editado por meu pai em Simão Dias.  Eram artigos simples, que escrevia sob o pseudônimo “Berto”, em que sempre focalizava um personagem de minha terra.
O artigo que escrevia e que deu origem à discussão com o redator-chefe.
Em uma manhã monótona em que nada se tinha a fazer, eu estava no meu birô, datilografando um artigo sobre o vendedor de quebra-queixo, quando se aproximou o chefe e, acintosamente, bisbilhotando o que eu fazia, iniciou uma discussão que culminou com ofensas mútuas. No mínimo fui chamado de comunista e, no vigor da minha juventude, respondi com firmeza e no mesmo tom de voz, usando os apelidos inconvenientes.  Foi um bafafá que repercutiu nas demais repartições do Paço Olímpio Campos. Saí da sala da imprensa dizendo que não mais trabalharia ali.   Fui socorrido por vários amigos, que me deram razão e se mostraram solidários, entre eles: o Secretário da Casa Civil e o Coronel Chefe da Guarda do Palácio.
O fato é que larguei o ofício de redator do Diário Oficial e fui promovido à Oficial de Gabinete do Governador. E a promoção não foi exclusivamente porque a razão estava ao meu lado. Eu era um simples garoto e o que realmente pesou foi nome do meu pai, que me deu irrestrito apoio, e o poder de decisão do meu conterrâneo e padrinho.
Passado o entrevero, mesmo desconfiados, tivemos que manter o diálogo e continuarmos a conversar por força do trabalho.
Pois bem. Como disse alhures, o redator-chefe adorava discursar e era considerado por muitos como um grande orador. Sabia dosar as palavras e gostava de citar grandes pensadores, dentre os quais um que sempre me deixou curioso: Simeon de Sá Bazu (ele fazia um biquinho para realçar a pronúncia francesa do “U” como se fosse um “i”).
Em seus discursos ele exclamava com ênfase:
- “Como dizia o grande filósofo e pensador francês ‘Simeon de Sá Bazu’, a vida nos apresenta momentos de grandes emoções...”
E por aí seguia seus inflamados discursos.
Em determinada tarde, impressionado ao ouvir a repetição do nome do ilustre pensador francês, minha curiosidade espanou o receito e, com esforço, ousei perguntar ao celebrado orador quem era realmente o filósofo Simeão de Sá Bazu.
Ele olhou-me sorridente, mostrando seus dentes frontais separados, e me surpreendeu com um resposta clara, simpática e sincera:
- Ora, ora, caro jovem. No mundo dos grandes oradores tudo é possível. Quando a memória falha, o improviso preenche a lacuna. Na verdade, o Simeon de Sá Bazii não é ninguém mais, nem menos, que o moleque SIMÃO, FILHO DE DONA BAZU, a baiana morena que vende acarajé e cocada ali na Rua de Pacatuba...
Aracaju, 08/12/2015

Beto Déda