terça-feira, 26 de agosto de 2025

 

Uma visita agradável



Na manhã de sexta-feira passada, 22/08/2025, tive a alegria de receber em minha casa a visita da querida Prof.ª Amanda Santos, doutoranda em História na UFBA, acompanhada do pesquisador João Paulo. Ambos estão realizando um estudo sobre a cultura popular em Simão Dias: as Zabumbas, os Reisados e os Sambas de Roda. 

Histórica visita: Doutoranda Amanda entre João Paulo e Beto Déda


Não é pouco dizer a felicidade que tive em notar que aqueles jovens estão tentando resgatar a história de fatos folclóricos de nossa terra. E mais ainda, por me darem a honra de prestar-lhes algumas informações sobre lembranças de minha infância na Praça de São João, onde, com muita curiosidade, observava os acontecimentos e guardava em minha memória.

Aproveitei, ao máximo, o interesse dos pesquisadores e conversei das 8:30 às 12:30 horas, relembrando fatos da minha terra. De tanto conversar, acredito que tenham pensado que eu tinha "bebido água de chocalho" (termo popular que antigamente se utilizava para as pessoas que conversavam demais). 

Com os simpáticos entrevistadores, comentei sobre a Zabumba do Mestre Terto Mangueira, que percorria os bairros da cidade e acompanhava as procissões religiosas no interior do município. Zabumba era a denominação que se dava a um grupo musical em que constava de um bumbo, tocado pelo Mestre Terto Mangueira, uma gaita (flauta feita com tubo de bambu) soprada pelo baixinho Dicuri, e um triângulo, cuja batida era do galego Timbira. Nos dias de hoje, tais grupos musicais são denominadas “Bandas de Pífaros”. Mas, na linguagem popular do simãodiense, o nome era Zabumba, e a gaita de bambu é o que chamam de pífaro. Como eram muito usadas, especialmente pela meninada, inclusive eu, as gaitas eram expostas para venda na feira livre nos dias de sábado. Mas o nome era gaita, nada de pífaro, que era mais difícil de pronunciar…

Na entrevista, lembrei do tempo em que me divertia observando a apresentação de reisados no interior. Minhas lembranças são das apresentações realizadas nas noite de sábado, no povoado Areal, em frente ao armazém de Seu Antônio de Silva, pai Leninha que desde aquela época era minha namorada. O grupo do reisado era formado por jovens e adultos, com roupas e chapéus coloridos, enfeitados com fitas de papel de variadas cores. Além das moças, compunham o grupo os seguintes personagens: a “besta-fera”, o “boi-janeiro” e o “caboclo”, este era a figura principal do reisado. Inicialmente apresentavam as danças, ao som de zabumba, depois começava a luta em que a “besta-fera” matava o “boi-janeiro”. E ao final do grande espetáculo, o caboclo realiza a partilha do boi, em um formidável e divertido canto rimado. Lembro de alguns desses rimas, pronunciados com graça pelo caboclo, intercalando cada verso, após ouvir o coro se pronunciar: “Iaiá, ô Iaiá, Óia o boi que te dá!”:

“O mocotó, é pra quem dorme só…

O lugar das ‘vergonha’, é pra dona Totonha…

O redém, eu não dou a ninguém...

A rabada, é da rapaziada…

A tripa mais fina, é pra estas meninas…

A tripa gaiteira, é das muié solteira...

Tudo era divertimento, com muitos aplausos para cada verso e alguns apontavam para alguém da plateia, como se fosse a beneficiária de determinada parte do boi. E a pessoa aceitava alegremente a brincadeira em estrondosa gargalhada. A diversão encantava a todos.

Também conversei sobre as comemorações do carnaval, das festas  de largo, em comemoração ao Natal e ao Ano Novo. Entre outros fatos lembrei das festas juninas, dos cortejos de casamento na roça e,  também, no mês de junho, a “Festa do boi”, organizada por Seu Jove da Marinete, que ganhava um boi bravo de um fazendeiro e, ele junto com uma turma de jovens, ia buscar na fazenda do doador. Era uma correria pelas ruas da cidade, com ligeira e tosca semelhança à corrida de touros na Espanha. A rês era abatida e a carne era servida em churrasco, à noite, na casa de Seu Jove, na Praça Jackson Figueredo, com muita música e dança.

Não deixei de mencionar os populares blocos carnavalescos, liderados por Negão, engraxate, Domingos Bina e Jerônimo, bem como as máscaras de carnaval feitas com papel jornal colados em modelos que fazíamos com argila recolhida no Tanque Novo.

De ver-se que naquela época se dava valor à tradição cultural da terra. E lembrei que nossa cidade teve a grandeza de contar com a colaboração de pessoas que incentivavam e ensinavam a juventude a manter as tradições locais, no que diz respeito ao teatro amador, aos folguedos juninos e ao gosto pela música. E faço aqui minha homenagem a simãodienses ilustres, do meu tempo e que me recordo agora: D. Carmem Dantas, D. Clarita Santana, Prof.ª Olda do Prado Dantas, Seu Zeca Laranjeiras, Jerônimo Santa Bárbara e Mestre Raimundo Macedo.

Com tantas recordações que tenho, o tempo não foi suficiente para narrar o que guardo dos acontecimentos folclóricos de minha terra. Mas aproveitei muito a oportunidade e fiquei feliz ao conversar com esses desbravadores da história contemporânea.

Depois de tudo, na hora do almoço, Leninha e Rosa Luxemburgo, não pestanejaram em perguntar aos moços: “Como aguentaram tantas horas de conversas? Seu Beto conversa pelos cotovelos, parece uma matraca”. E eu, com meus botões, replicava: -Ora, pois...

Espero que minha longa e por vezes dispersa conversa não tenha esgotado a paciência dos pesquisadores e, se paciência ainda tiverem, aguardo que voltem para novas lembranças e consultas aos meus desorganizados e implacáveis arquivos.


Aracaju, 25/08/2025

Beto Déda




quarta-feira, 6 de agosto de 2025

 

A Festa de Nossa Senhora Sant’Ana em Simão Dias



Para muitos nordestinos dos velhos tempos, alguns meses do ano civil tinham denominações especiais, sempre relacionadas a eventos religiosos festivos. E o simãodiense não fugia a essa regra e tinha um nome distinto para o mês de julho, que passou a ser chamado de "mês de Sant'Ana", pela lembrança da época do ano que acontecia a consagrada festa em  homenagem à padroeira de nossa cidade.  Esta a razão pela qual sempre ouvíamos os conterrâneos, ao mencionarem um fato que aconteceu no mês de julho, costumeiramente associarem ao período da festividade da padroeira, dizendo, por exemplo: “Fulano nasceu no dia 7 do mês de Sant’Ana"; ou que "Tal caso o aconteceu no final do mês de Sant’Ana de 1962”

Pois bem, foi no período de 17 a 26 do mês de Sant’Ana deste ano, que a cidade de Simão Dias prestou homenagem à sua Excelsa Padroeira. É nessa época do ano que a cidade se remoça ao receber conterrâneos residentes em outras localidades, tudo em um clima de muita alegria, de amizade e de fé, participando de novenário e, no dia 26, consagrado a Nossa Senhora Sant’Ana, acompanhando a procissão pelas ruas da cidade até a praça Matriz, onde é realizado o ato de encerramento.


Igreja Matriz de Simão Dias -em 19-07-2025 - Foto de vídeo no YouTube



Infelizmente não pude comparecer às festividades deste ano, por problemas de saúde, devido a  uma irritante virose. Embora distante, acompanhei todas as novenas através do site da Paróquia de Simão Dias. E, por sugestão de minha amiga Professora Amanda Santos, assisti pelo YouTube ao vídeo “Documentário Senhora Sant’Ana de Simão Dias”, uma importante transmissão sobre a história de nossa paróquia, narrada por inteligentes historiadores conterrâneos: Padre Rodrigo e os professores Jorge Bastos, Geraldo Prata, Edjan Alencar e o pároco Éder Dias. 

No referido vídeo, ao acompanhar as informações prestadas pela Professora Edjan Alencar, minha memória foi estimulada a recordar fatos dos anos 50 e 60 do século passado, quando era jovem e vivenciava os acontecimentos festivos de nossa paróquia. O fato é que, naquela época, sempre acompanhei minha tia Nice (Eunice Barbosa de Oliveira, conhecida na cidade como Nice Enfermeira) em suas participações religiosas. Ela tinha sido noviça em um Convento de Freiras, em Salvador(BA), daí a sua devoção e dedicação à Igreja de Senhora Sant'Ana: fazia parte do Apostolado da Oração e da Pia União das Filhas de Maria. Foi ela a minha grande instrutora religiosa, levando-me para as aulas de catecismo, para as novenas e as missas. Até hoje ainda me lembro, e canto, trechos de hinos sacros de então.  

Semelhante ao que acontece na atualidade, também naquela época os rapazes e moças participavam contritos da “Novena dos Jovens", desfilando pelas ruas da cidade para receber e entregar o Ramo Simbólico do patrocinador da novena. Os desfiles sempre contavam com o acompanhamento da Filarmônica Lira Santana. 

Nas festividades dos anos 1960 a 1964, os fiéis de Sant'Ana tiveram a alegria de contar com a participação do Padre Sebastião Drago, da Congregação do Sagrado Coração de Maria,  um orador sacro que empolgava os fiéis com palavras fluentes, vibrantes,  ricas de imaginação e conviventes. Ele fazia parte da Equipe de Pregadores Missionários  da Casa de Belo Horizonte, e durante alguns anos participou de missões em Sergipe e Bahia. Aqui em Simão Dias, em 1953, ele acompanhou o Frei Elizeu Vieira, um estimado evangelizador da Ordem dos Carmelitas, em Santas Missões realizadas na zona rural, preparando nosso povo para o  Congresso Eucarístico que aconteceu em nossa cidade ainda naquele ano. Foi sua importante participação nesses eventos que o Padre Drago se revelou para nosso povo como o "Dragão da Palavra", daí o acerto do pároco Padre Mário Reis, em convidá-lo como para participar  da novenas de Sant'Ana nos anos de 1960 a 1964, como pregador oficial nos  sermões das missas e das novenas. 


Padre Sebastião Drago na procissão (Foto capturado da Internet)

A atuação brilhante do orador sacro Sebastião Drago  atraiu a atenção de nossa juventude, especialmente no meio dos que faziam parte da Associação de Jovens Idealistas  Simãodienses (AJIS), que vibravam ao ouvi-lo e notar a inteligência e a cultura daquele pregador, expresso não só em seus sermões como também na arte da música e na pintura. Por ocasião do Congresso Eucarístico, nos atos litúrgicos, ele executava muito bem o  harmônio e regia o coro de seminaristas italianos. E diziam também, não estou seguro sobre isto, que na Igreja Matriz da cidade baiana de Cícero Dantas estavam expostos dois painéis pintados por ele, retratando a Ceia de Emaús e a Assunção de Nossa Senhora. 

O referido vídeo sobre nossa Paróquia também me trouxe ligeiras lembranças dos vigários do tempo que morava na terra natal. O primeiro que conheci, eu tinha aproximadamente 8 anos de idade, foi o português Padre Madeira,  ele  usava uma batina preta e, lembro bem, portava  um pequena bolsa com moedas de centavos que presenteava às crianças quando lhe pedíamos a bênção. E não faltavam os pedidos de bênçãos! 

O segundo, foi o Padre Afonso, da família Medeiros Chaves de Propriá(SE), foi o nosso pároco por ocasião do o maior acontecimento católico de nossa cidade, o Congresso Eucarístico de 1953.

Em seguida foi a vez do Padre Mário Reis, que prestou grande serviço ao nosso povo, especialmente no diz respeito à educação, foi diretor do Ginásio Carvalho Neto. Do padre Mário desperta minha memória para um fato engraçado: ele não gostava que a meninada se sentasse no batente das portas laterais da Igreja. Em uma manhã de frio, eu e meu primo José Carlos Déda, estávamos em animada conversa,  sentados no batente de uma das  portas laterais, que estava fechada e que  fica ao lado da casa paroquial; o padre nos viu e, sorrateiramente, entrou na Igreja e lançou por baixo da porta um balde d'água, molhando nossos fundilhos. Diante de nossos protestos, ouvimos a risada estridente do nobre padre. Foi um fato inusitado ver o Padre Mário gargalhar... 

O seguinte foi o Padre Aureliano Silveira, que demorou poucos anos na cidade e cuja lembrança maior foi que conquistou e levou com ele uma jovem  simãodiense bonita e, dizem, com ela se casou.  

Por último, foi o Padre João Barbosa, do qual guardo a melhor lembrança, porque foi ele o celebrante do meu casamento religioso.

Em 1975, por força de meu trabalho com funcionário do BNB,  tive que me ausentar de Simão Dias, fui morar em outras plagas, mas, no mês de Sant'Ana, estava sempre  na minha terra reverenciando nossa padroeira e reencontrando parentes e amigos. Pena que este ano  uma desconfortante virose  tenha me impedido de presenciar tão magnifica festa.

Restou-me como consolo os vídeos e as recordações. 

Aracaju, 05/08/2025

Beto Déda



sexta-feira, 4 de julho de 2025

Uma homenagem a Castro Alves.


Nesta primeira semana de julho, mês de Senhora Santana, minha memória foi direcionada ao meu querido e saudoso irmão, Artur Oscar de Oliveira Déda. E a lembrança ocorreu ao examinar meus implacáveis arquivos e reler a Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Sergipe, edição número 15, ano 1971. Nessa revista, às páginas 173/180, foi publicado o texto da palestra pronunciada por Artur Oscar, no Auditório da Faculdade de Direito, em cerimônia comemorativa ao centenário da morte do poeta Castro Alves.


Naquela época , o nome de simãodienses abrilhantavam o corpo docente de nossa Faculdade de Direito. Lá estavam o Dr. Belmiro Silveira Gois, que lecionava Direito Civil I; e Artur Oscar, que ensinava Direito Civil II. Na cadeira de Direito Internacional Público estava o Dr. Joviniano de Carvalho Neto, filho do renomado jurista simãodiense Dr. Carvalho Neto, que fora professor emérito daquela Faculdade.


Segundo divulga o citado exemplar da Revista da UFS, a conferência proferida pelo Prof. Artur Oscar “contou com a presença de Professores e grande assistência de alunos”. O palestrante apresentou um estudo sobre o poeta baiano Castro Alves, evidenciando seu ideal libertário e sua luta contra a escravidão, com poemas que tocavam a alma do povo, destacando-se: “Navio Negreiro” e “Vozes d’África”.


Não fui aluno escolar ou universitário do meu saudoso irmão, embora tenha feito o curso de Direito, mas ele e meu pai foram meus excepcionais mestres. Como eu era curioso, ficava boquiaberto acompanhando os bate-papos culturais entre eles, e fazia perguntas e recebia lições formidáveis, com orientações para ler bons livros. Quando eu era jovem, não tínhamos televisão, nem telefones celulares, mas tínhamos todo o tempo disponível para leitura, e aproveitei muito isto, lendo livros clássicos da pequena biblioteca de meu pai. Foi por orientação deles que me interessei pela poesia de Castro Alves. E decorei estrofes de poemas que me impressionaram e algumas delas são citadas na palestra de Artur.


Quando meu pai (Carvalho Déda) publicou os livros “Simão Dias – fragmentos de sua história” e “Brefácias e Burundangas do Folclore Sergipano”, presenteei exemplares a colegas do Banco do Nordeste e, invariavelmente, reproduzia na dedicatória o seguinte trecho pinçado de uma estrofe tirada do poema “O Livro e a América”, em que o magistral Castro Alves dedicava ao Grêmio Literário”,

Oh! Bendito o que semeia

Livros… livros à mão cheia…

E manda o povo pensar!

O livro caindo n’alma

É germe – que faz a palma,

É chuva – que faz o mar.”

 Do poema “Navio Negreiros”, nunca esqueci a estrofe em que o poeta percebe a bandeira que “imprudente na gávea tripudiava”, transformando-se em manto impuro, para cobrir tanta infâmia e covardia. Eis a estrofe:

Auriverde pendão de minha terra,

      Que a brisa do Brasil beija e balança,

 Estandarte que a luz do sol encerra

   E promessas divinas da esperança…

Tu que, da liberdade após a guerra

Foste hasteado dos heróis na lança

Antes te houvessem roto na batalha,

      Que servires a um povo de mortalha!…”

Sobre esta estrofe, fico a pensar o que escreveria o grande poeta, se vivesse conosco na atualidade, e notasse que o nosso estandarte fora indignamente raptado para transformar-se em manto de extremistas, que estimulam o ódio e o preconceito.  

...

Acredito que as recordações que tive não sugiram do nada. É possível que tenha sido impulsionado pelo inconsciente coletivo ou a sincronicidade, tudo despertado pela proximidade da data em que o “Poeta dos Escravos”, em  06 de julho de 1871, com apenas 24 anos de vida produtiva, passou para o mundo celestial. No próximo domingo perfaz 153 anos que nos deixou.


Pensando também em homenagear o grande poeta do Brasil, transcrevo, a seguir, o texto escrito por meu saudoso irmão Artur Oscar, e que serviu para sua palestra em solenidade realizada na UFS, em julho de 1971:








E para encerrar, expresso aqui minha alegria em relembrar esses acontecimentos para homenagear um baiano moço e genial, que usando a poesia, lutou bravamente contra a escravidão e na defesa da liberdade. Viva Castro Alves!

Aracaju, 04/07/2025

Beto Déda

sexta-feira, 20 de junho de 2025

 

O encontro de idosos operados…


Nesta semana, ainda em repouso de uma cirurgia, tive a satisfação de me encontrar com um conterrâneo e me alegrar com lembranças de acontecimentos chistosos dos velhos tempos em nossa terra natal. Lembramos de patrícios notáveis e de fatos alegres, desses que nos fazem melhorar o humor e aliviar a tensão dos dias atuais.

Desenho da conversa de idosos
(Utilizando IA, edição de Beto Déda e Amanda Santos)

No meio da conversa, eu informei que fora submetido a uma exitosa cirurgia de catarata e que, embora ainda convalescente, já sentia os efeitos benéficos da operação. Ao saber dessa novidade, o amigo riu muito, e passou a me contar o vexame que ele teve quando foi submetido a uma cirurgia de vesícula (confessou que tinha sido operado por várias vezes!).

Resguardando o nome do amigo confidente e do local de sua cirurgia, passo a narrar detalhadamente, sem diminuir ou acrescentar, tudo que ele me contou, mas para isto, devo esclarecer que recebi seu “nihil obstat”. 

Disse-me que chegou ao hospital apreensivo e ansioso, com ligeiro temor da nova operação. O ambiente era frio, com temperatura regulada por potentes aparelhos de ar-condicionado. Esfregando as mãos freneticamente para aquecê-las, aguardou sua chamada. Um serviço de alto-falante, com som duvidoso, chamou seu nome. Acompanhado de uma enfermeira, dirigiu-se ao centro cirúrgico, passando antes pelo sanitário (conhecido nos velhos tempos como “privada ou sentina”) para aliviar a bexiga (tirar água do joelho, com dizem os biriteiros). Antes de entrar no centro cirúrgico, passou pelo vestiário, para trocar a roupa por um “avental curto e aberto”, que cobria apenas o tronco, deixando as pernas e braços nus.

Antes de tirar a roupa, foi orientado pela enfermeira a tirar todos os acessórios do corpo: próteses e outras peças artificiais, caso usasse para auxiliar a função de algum órgão. Ele balançou a cabeça, em sinal de que tinha entendido e, em seguida, recebeu uma cesta para guardar os instrumentos auxiliares de seu corpo...

Então, sorrindo, demonstrando seu admirável humor, disse-me como retirou cuidadosamente cada peça. A primeira foi a peruca, que cobria sua brilhosa careca, em seguida foi uma sequência de instrumentos artificiais: o aparelho para surdez; a dentadura; uma pulseira de cobre de uso terapêutico, para aliviar dores e melhorar a circulação do sangue; um cordão com búzios para abrandar mau-olhado; e, finalmente, tirou de uma das narinas uma folha de arruda, que acreditava ser boa para melhorar as vias respiratórias.

Depois de tudo, lembrou que tinha uma prótese que não sabia como tirar. Então, com acanhamento e ar de dúvida, resolveu informar sobre essa peça auxiliar para a enfermeira. Disse ele: “- Doutora, eu tenho uma prótese na parte íntima do meu corpo, mas não posso tirar…” , e baixou a cabeça, encabulado, esperando uma resposta. A moça respondeu com um sorriso: Deixe-a no respectivo lugar. Não vai poder tirar e também não terá serventia aqui. Aliviado da dúvida, ele conservou sua prótese peniana no devido lugar...

Depois de despir a gasta carcaça de tantos acessórios, foi aguardar sua vez na antessala do centro cirúrgico, onde sofreu com o frio descontrolado do ambiente. Ato contínuo, sem aguentar a baixa temperatura, exclamou: “Estou virando um picolé! Por favor, regulem esse diabo de aparelho!" . E foram salvos por uma simpática moça…

Por fim, o meu confidente afirmava sobre o sucesso da cirurgia da vesícula e, lambendo os beiços de satisfação, concluiu sua narrativa dizendo que hoje pode tomar sua boa cerveja (que apelida de “loura gelada”) sem a preocupação dos vômitos de bílis....

E a cada uma dessas informações o meu amigo se esbaldava em espontâneas risadas. E afirmava, com razão: “Ainda bem que a ciência nos auxilia a enfrentar os percalços da bendita caminhada ladeira abaixo”.

...

É bom conversar com pessoas alegres, tipos que tornam chistosas suas experiências, mesmo aquelas que ninguém deseja.

Um abraço ao bom e hilariante conterrâneo.


Aracaju, 20/06/2025

Beto Déda


terça-feira, 22 de abril de 2025

 

O grande Serafim, um amigo dos velhos tempos.


De minha mocidade vivida na Praça de São João, em Simão Dias(SE), eu guardo lembranças de muitos amigos que compartilhavam brincadeiras e algazarras comuns da época. Entre eles, lembro-me bem do mais alto de todos, com longas e finas pernas, e que parecia ser o mais velho da turma. Era o Serafim ou Sarafim, magro, empinado, rosto comprido, nariz afilado, olhos vivos e sempre usava um boné surrado, cobrindo seu cabelo meio sarará.

Era um garoto quase rapaz, muito criativo, com uma incomum curiosidade por tudo que fosse novidade. Divertíamos ao colher e saborear as mangas e cajus colhidos nos sítios de Seu Jovino, Seu Hilário e Seu Pierre. Também tentávamos as mangueiras do Seu Otávio Moganga, mas eram dificultosas devido a uma cerca alta de pau-a-pique.

Nessas aventuras, a ajuda de Serafim era importante devido a sua altura e seus longos braços que seguravam e balançavam com vigor os galhos das mangueiras, derrubando as mangas de vez, quase maduras. No sítio de Seu Otávio, Sarafim usava uma vara para puxar os frutos caídos no chão, aproximando-os da cerca para pegá-los.

Nas manhãs quentes, durante a semana, a turma ia se refrescar no poço do riacho Caiçá, que ficava antes do Matadouro Municipal. Água límpida, transparente. que dava a ilusão de ser um poço raso, era um perigo para os que não sabiam nadar. Então, o Serafim era o primeiro a pular na água, de modo a saber a real profundidade do poço. Era a primazia que todos concordavam pela altura dele. Mas não deixava de haver protestos porque ele sapateava e turvava as águas cristalinas. Do mesmo modo ele testava o açude do bairro Areal, e também um poço chamado Mariquita, que ficava nas margens do açude federal, na antiga estrada que ligava Simão Dias a Lagarto.

O mais interessante do Serafim era sua graça em prosear fazendo rima. De tudo ele rimava. E gostava do folclore da terra, de ouvir os repentistas na Rua da Feira e aprimorar sua verve poética. Eu costumava ouvi-lo e quando perguntava alguma coisa ele sempre respondia com rima. Qualquer conversa despertava-lhe o senso repentista. Gravei em minha memória a resposta que ele me deu na primeira vez que lhe indaguei o nome correto. E sempre que o encontrava, repetia a pergunta que se tornou uma espécie de saudação: Serafim ou Sarafim? E ele respondia sem pensar: -“Que importa se Serafim ou Sarafim, Cuida de você que eu cuido de mim”; e Sorria, mostrando os dentes amarelos...

Curioso que era, procurava sempre algum afazer que lhe trouxesse alguns trocados. No inverno, cuidava de consertar guarda-chuva e sobrinhas. Quem tinha um sombreiro com armação quebrada procurava-o e o reparo era feito, com garantia. E fazia propaganda de sua arte, transportando um guarda-chuva nas costas pendurado na gola de sua camisa. Recordo-me, agora, de uma noite em que estava no Cine Brasil, quando o Sarafim entrou com o guarda-chuva pendurado na gola da camisa. Ao meu lado estava Luiz Santa Bárbara e uma moça sua parente, que visitava a cidade. E o Luiz esclarecia para a garota todos os detalhe do cinema e das pessoas que passavam entre as cadeiras. Quando avistou o Sarafim, acrescentou: “Está vendo aquele moço com um guarda-chuva nas costas? É um poeta repentista, um artesão e o cara mais alto da cidade!”. Ele ouviu o comentário e gesticulou seu modo característico de aprovar, tocando o beiço superior no nariz.

Serafim tudo sondava com paciência e isto despertava nosso interesse por tudo que ele fazia. Muitas vezes o surpreendíamos concentrado, apreciando pacientemente as árvores, os pássaros, os pequenos animais e os insetos. Certa vez notamos que ele estava observando uma pequena formiga que transportava uma folha de uma planta. Então, ele esclarecia para todos nós que aquela formiguinha tinha andado cerca de 10 metros (mais ou menos a medida da calçada do portão que ficava no quintal da casa de meus pais) carregando uma folha que era quase dez vezes maior que ela. E dizia:

Formiguinha danada de forte! Vejam a inteligência dela e a ajuda das outras para entrar no formigueiro com a folha”.

E concluía dizendo com seu jeito simplório, que traduzia inteligência: “Prestem atenção como as formigas nos dão uma lição maravilhosa de força de vontade, de união e de distribuição de tarefas!”.

Nas tardes de trovoada, a Praça de São João era infestada de tanajuras, e o Sarafim era quem nos estimulava a cantar, rimando: “Cai, cai tanajura, na panela de gordura, para agente saborear”.

"Cai, cai tanajura na panela de gordura", do folclore sergipano.

Capturávamos as tanajuras e enfiávamos um palito no parte trazeira, para ouvir o zumbido das asas imitando o som dos helicópteros. Depois, admirados, víamos o Sarafim juntar algumas folhas secas, fazer um foguinho e assar as gordas bundas das tanajuras para comê-las, deliciando-se. Embora para alguns isto fosse estranho, anos depois, assistindo a um filme documentário (Mondo Cane, de Gualtiero Jacopetti), soube que, em um restaurante dos mais chiques da cidade de Nova Iorque, o prato muito apreciado e mais caro era o de tanajuras torradas. Serafim não estava só em seu gosto por formigão...

Passados tantos anos, remoendo essas reminiscências, fico a pensar onde estará o velho amigo? Quem poderia responder essa pergunta era outro companheiro daquela época, o sempre lembrado Tonho de Manequinha, mas ele já está em outro plano, na paz celestial.

Para mim, esteja aqui ou alhures, o grande Serafim é imortal, sempre me lembrarei de seus feitos.

Aracaju, 22/04/202

Beto Déda



terça-feira, 18 de março de 2025

 


Os óculos de um leitor obstinado…



Recentemente tomei conhecimento que uma querida amiga passou a usar óculos. Pareceu-me com absoluta razão o oftalmologista ao lhe prescrever o uso de lentes para descanso da vista, diante da atividade que ela se dedica diuturnamente: ler e pesquisar. Notei que os óculos se ajustaram perfeitamente em seu rosto simpático. E por falar em óculos, me ocorreu a lembrança de um conto que tomei conhecimento há muitos anos

Embora o conto que pretendo narrar não tenha nada ver com minha amiga, devo esclarecer que dois pontos despertaram minha memória para uma história que tive conhecimento quando era jovem: o uso de óculos, o fascínio pela leitura e o atual estágio de conflitos por que passa a humanidade. Não estou seguro se esse conto eu li em um livro da biblioteca de meu pai, ou se foi ouvindo um programa radiofônico de contos macabros, transmitidos pela Rádio Nacional, com o título “Incrível, Fantástico e Extraordinário”. Também pode ter sido um filme que assisti no Cine Ypiranga, em Simão Dias, ou talvez eu tenha visto na televisão, em Salvador, quando era estudante. Mas essa dúvida sobre a autoria e a origem do conto não me desvanece da ideia de transmitir o que minha memória guarda da incrível história, envolvendo um par de lentes, um leitor obstinado e uma estúpida guerra. Então, confiando na memória, narro a história, preenchendo os vazios da lembrança usando a criatividade.

Um senhor de meia idade, bancário, chefe da tesouraria de um banco, era um inveterado leitor que vivia em uma grande metrópole. Ele era dessas pessoas que liam até durante as refeições. Nunca deixava de ter um livro ao seu alcance e quando não era possível, distraía-se lendo jornais, folhetos de propaganda e bulas de remédios. Era um tarado por leitura e, como era míope, usava óculos com lentes de grau, parecendo fundo de garrafa.

Naquele tempo, os chefes das grandes nações estavam em conflito, prevendo-se uma devastadora guerra nuclear. A cidade onde residia o obstinado leitor estava em pânico. Era um caos inquietante. A iminência de uma catástrofe deixava a população daquela capital intranquila e ruidosa. Nesse ambiente, o bancário e incansável leitor, sabendo que o infernal barulho das ruas prejudicaria sua concentração nas leituras, procurou uma solução. A caixa forte do banco era grande e tinha horário eletrônico programado para abrir e fechar a grande porta de aço. Então ele teve a ideia de passar aquela noite no grande cofre, onde o silêncio era sepulcral. Ali poderia ler, sem a perturbação do alarido das ruas. Providenciou livros, café e sanduiches e no horário programado para o fechamento automático da porta de aço, penetrou no grande cofre. Passou a noite trancado, deslumbrando-se em uma viagem maravilhosa que se lhe apresentava em sua imperturbável leitura. Na manhã seguinte, no horário programado, a porta automática abriu. Ele espreguiçou-se e saiu da caixa forte, deparando-se com uma paisagem de horror.


Imagem dos efeitos da guerra divulgado nas redes sociais via Google


A cidade estava destruída, o silêncio era interrompido apenas pelo som de uma brisa sufocante. O que se avistava era o caos: prédios destruídos, automóveis em desalinho e, o pior, sem um único vestígio de pessoas; nem mesmo se avistava corpos mutilados. A população fora aniquilada, dissolvida, desaparecera como por encanto. Talvez um raio mortal tenha fulminado os corpos. O bancário fitou os escombros, limpou o embaçado óculos e sentou-se pensativo. Horrorizado com aquela paisagem, avistou ao longe o prédio onde funcionava a Biblioteca daquele bairro. Era um edifício antigo, que ficava no alto, com uma grande escadaria em frente. Ele diariamente a visitava.

Tomou fôlego e andou entre os escombros em direção ao local da Biblioteca. Ainda segurava em sua mão um livro clássico: “Guerra e Paz”, de Leon Tolstói. Aproximou-se do prédio destruído e notou que uma parte não atingida apresentava vários livros esparramados ao lado de uma estante caída. Lamentando os efeitos da guerra, sentiu um lampejo de alegria e exclamou com seus botões: “Nem tudo está perdido”. Arrumou alguns livros ao pé de uma poltrona empoeirada e admitiu que somente lhe restava passar o resto da vida lendo, solitário. Olhou ao longe um exemplar da obra de Ernest Hemingway (Por Quem os Sinos Dobram), pegou-o e, quando ia sentar na poltrona, foi surpreendido por uma explosão, possivelmente provocada por um vazamento de gás. O susto o estremeceu e os óculos do inveterado leitor caíram no chão.

Então, sem enxergar quase nada, o infausto bancário se abaixou e, tateando, passou a mão pelo chão, procurando encontrar os óculos. Encontrou-os, mas teve a sensação triste de notar que as lentes estavam em farelos, imprestáveis. Expressou sua emoção, em um grito de lamento e dor. Com as pernas trêmulas, deu alguns passos, tropeçou em pedras soltas e caiu, rolando degraus abaixo e quedando-se para não mais se levantar. Perdeu tudo que queria e, em transe de desespero, esvaiu-se resignado, sendo tragado por um raio mortal, da destruidora guerra.

Aquele desesperado senhor, atordoado com aquela triste situação, apegou-se ao que lhe restava: a leitura. Pouco durou seu alívio. Um simples par de lentes quebradas frustrou todo seu sonho e foi engolido pelo raio mortal de uma terrível guerra.

...

Ao concluir esse texto, devo repetir que a essência desse conto de final trágico eu li, ouvi ou vi em algum lugar: um livro, uma revista, um filme ou na televisão, lá pelos início da década de 1960. Não me lembro onde e nem recordo o seu autor. O certo é que usei minhas palavras para transmitir, aqui e agora, para os parentes e amigos, a tristeza e o horror que causa os descontrolados conflitos entre os homens. Não podemos admitir que o ódio, o preconceito e a força sem limites das armas sejam um perigo para a coletividade. Do mesmo modo não podemos admitir que não sejam responsabilizados e punidos os que planejam e praticam atos violentos. A falta de punição agrada os facínoras, estimula a repetição de ilegalidades e provoca guerras.

Não podemos esquecer que, atualmente, a humanidade defronta-se com conflitos entre as nações que abalam a segurança do mundo.

Que Deus nos livre da agonia vivida pelo personagem do conto.

Aracaju, 17/03/2025

Beto Déda

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

 

O Dia que Sansão visitou Simão Dias


Nesta semana me lembrei do dia que um senhor conhecido por Sansão apresentou-se em minha terra natal.

A lembrança aconteceu em decorrência de uma conversa recente que tive com minha filha Carla, quando ele sugeriu cortar meus raros e compridos cabelos, que eu deixara arrepiados e esvoaçantes, imitando o personagem Ravengar, interpretado por Antônio Abujamra na novela “Que Rei Sou Eu?”.

Ao ouvir minha resposta desfavorável ao corte, D. Lena fez a seguinte observação: “Certamente Beto quer deixar crescer pra fazer tranças...”

Então eu complementei que realmente faria uma grande trança, igual a do forte Sansão que visitou Simão Dias na segunda metade dos anos 50,  época  que eu era garoto. E para que os mais novos conheçam os detalhes do aparecimento de Sansão em nossa terra, passo a narrar como tudo aconteceu.

A notícia da visita foi divulgada por um circo que estava armado no largo do Bonfim de Baixo, no local que hoje é um anfiteatro (praça de eventos), na antiga Praça Nicanor Leal. A divulgação foi feita pelas ruas da cidade por um palhaço, com pernas de pau, usando um grande funil para ampliar o som. Dizia o anunciante que o Sansão estaria se apresentando no circo na noite de domingo e que para demonstrar sua força e poder, faria uma ligeira apresentação gratuita na Praça Barão de Santa Rosa, local em que puxaria um caminhão usando a força de seus cabelos.

Como sempre fui muito curioso e não queria perder detalhes do acontecimento, fui para a praça no início da tarde daquele domingo. O local escolhido para apresentação foi em frente ao consultório de Dr. Salustino, ou seja, no trecho entre o casarão do Hotel de Seu Liminha (que depois passou a ser o hotel de D. Miné e hoje é a casa da Professora Virgilinha) e, na outra esquina, a casa onde morava Seu Libério Fonseca, que depois foi do pai de Floriano Nascimento. Tudo já estava sendo preparado: o caminhão de Dão Rodrigues – marido de D. Matilde Dortas, que era diretora do Grupo Escolar Fausto Cardoso – já estava ali estacionado e o popular Zé Súia cuidava de varrer o local, a pedido do Sansão, de modo a evitar que a areia sobre o paralelepípedo provocasse o deslizamento de seus pés no esforço para puxar o caminhão.

Passei a ouvir com atenção os comentários do grupo de adultos que se juntou em frente ao caminhão, alguns crédulos e outros duvidando da possibilidade do tal Sansão mover o pesado caminhão. E diversas foram as opiniões, muitas delas seguidas de alegres risadas...

Pouco depois, quando já havia um razoável número de curiosos, apareceu o Sansão. Era um homem realmente forte, alto, moreno, cabelos longos dispostos em uma grossa trança; usava um traje típico, numa imitação desengonçada do artista Victor Mature, no filme Sansão e Dalila, dirigido por Cecil B. DeMille.

Tudo foi cuidadosamente preparado. Uma forte corda foi amarada na frente do caminhão e foi o próprio Dão que ajudou a fazer a amarração dos cordões dispostos no final do cabo à trança de cabelos do musculoso artista. Ecoaram gritos de vários lugares e o coordenador do evento pediu silêncio, para o atleta se concentrar.

Após um ligeiro silêncio, foi dado o sinal e o Sansão, com grande esforço, começou a puxar o pesado caminhão, vagarosamente, até alcançar a marca de cinco metros, marcados no piso de paralelepípedo. Em seguida ouviu-se os aplausos, inicialmente tímidos que se transformaram em grande aclamação. E o artista agradeceu curvando-se diante da plateia.

Naquela noite, o circo esgotou os ingressos. O grande astro foi Sansão, que fez várias apresentações, entre as quais lembro-me da quebra de vários tijolos com um simples soco, e da parte em que o forte simãodiense Braúna (que cuidava do balanço de seu Raimundo nas festas natalinas) foi convidado a manejar uma pesada marreta e quebrar uma enorme pedra colocada em cima do busto do artista. E o Braúna caprichou. Essa foi a cena mais aplaudida.

No meu pensar de garoto, acreditei na veracidade do espetáculo. Mas o acontecimento foi motivo de várias discussões no correr da semana e não faltaram comentários adversos, dos inconformados, sugerindo que tudo não passava de uma grande fraude. Seria?

Não! Para mim não houve truque, nem magia! Não mudei meu ponto de vista do tempo de garoto. Os saudosos Dão Rodrigues e Braúna jamais participariam de uma falsidade.

Ainda hoje tive a alegria de perceber que não foi ilusória minha convicção. Pesquisei via internet e notei que tais proezas acontecem em várias partes do mundo. Como exemplo, constatei que na Inglaterra um indiano conseguiu puxar pelos cabelos um ônibus duplo, daqueles usados em Londres, pesando 8 toneladas, num percurso de 20 metros e seu nome ficou registrado na lista de recordes do Guinness Book. A façanha do Sansão que esteve em Simão Dias também acontecia e acontece em outras partes do mundo.

Veja isto no YouTube:

Foto capturada de vídeo no YouTube


Diante do que narrei é de se perceber que se trata de coisa de idoso, que relembra de velhos acontecimentos partindo de uma simples discussão sobre o desalinhamento de seus poucos e quase esbranquiçados cabelos.

Mas é melhor me entreter com meu prolixos textos sobre os bons tempos de criança do que se preocupar com as ameaças de guerra que atualmente ocorrem entre os dirigentes de grandes nações.

É o que queria transmitir aos meus amigos e conterrâneos.

Aracaju, 04/02/2025

Beto Déda