Os sapatos do Padre Pedro
A Professora Zamor de Melo tinha origem em Aquidabã e era
tia dos amigos benebeanos Antônio Carlos Melo Maynard, que foi meu colega nas
Agências do Banco do Nordeste, em Simão Dias e em Aracaju, e Alberto Maynard,
que foi o Chefe do Departamento de Auditoria na Direção Geral daquele banco, em
Fortaleza.
O padre Pedro (Pedro Alves de Oliveira) era de Riachão
Dantas. Aqui em Aracaju ele notabilizou-se
por sua fé e por seu trabalho de dedicação ao próximo. Seguia cuidadosamente os
ensinamentos de Cristo, dedicando-se aos menos favorecidos. Ele foi considerado
o sergipano mais importante dos últimos 100 anos, em enquete patrocinada pela
TV Sergipe, no ano 2000. Seus familiares são personalidades do meio cultural
sergipano: os artistas plásticos J. Inácio, seu irmão, e CAÃ, seu sobrinho; e o
professor da Universidade Federal de Sergipe: Rafael Oliveira, também seu
irmão.
O padre e a professora tinham em comum o respeito e a
admiração do povo sergipano.
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Padre Pedro Foto do http://aracajuantigga.blogspot |
Conheci o Padre Pedro quando eu era aluno do Ginásio Jackson
de Figueiredo, um colégio de ensino católico. Os alunos internos frequentavam a
missa dominical na Catedral, ministrada pelo Bispo Dom Távora, conhecido como o
bispo dos operários. O Padre Pedro ajudava nas festas da principal igreja do
bispado. Todo ano, na véspera do domingo de páscoa, os estudantes faziam a
confissão para comungarem na missa pascal. A Catedral ficava repleta de
juventude e o confessionário do Padre Pedro era logo identificado pela longa
fila de jovens. A moçada preferia se confessar com o padre que não esmiuçava
nem procurava detalhes das faltas reveladas, ouvia de relance os pecados e
recomendava que o pecador rezasse três padre-nossos e três ave-marias na
contrição de não mais pecar, pedindo a absolvição dos erros cometidos. Padre Pedro
era o exemplo de um verdadeiro sacerdote.
Certa vez, comentando sobre o comportamento de um vigário do
interior sergipano, disse-me meu tio Paulo Déda que conhecera muitos padres, a
maioria dedicados à religião, mas que um deles se distinguia por sua dedicação
em seguir os ideais humanitários pregados por Jesus, especialmente no que dizia
respeito à solidariedade aos indefesos e o amor aos pobres e humildes. Dizia
ele, com absoluta razão, que esse padre chamava-se Pedro, seu conterrâneo de
Riachão do Dantas. E, então, contou-me um fato curioso que repasso aqui.
Em um dia de inverno, estava meu tio em sua loja, Esquina da
Economia, a conversar com o Sr. Camilo, que também era proprietário de uma casa
comercial ali próximo. Observaram que em frente à loja o Padre Pedro prestava ajuda a
um faminto mendigo. Com seu alhar perspicaz de sapateiro, o tio Paulo percebeu
que o padre usava sapatos rotos, velhos mesmo. Convidou-o a entrar na loja e o
convenceu a aceitar um par de sapatos novos como presente. O padre não teve
como evitar a oferta, porque os sapatos velhos e furados causavam dores em seus
pequenos pés devido a umidade, ocasionada pelas pisadas em calçadas molhadas, e
as pedrinhas que entravam pelos buracos no solado. Agradecido, o padre aceitou
o presente.
Na semana seguinte, meu tio constatou que o padre voltara a
usar sapatos rotos. Não se conteve e perguntou o que tinha acontecido. E o
bondoso padre disse que, em sua caminhada pelas ruas de Aracaju, deparou-se com
um pobre trabalhador que usava sapatos velhos, ruins mesmo, e não se conteve: passou-lhe
seus sapatos novos em troca dos velhos. Meu tio, sentindo a solidariedade aflorar
na expressão do humilde conterrâneo, pegou novo par de calçados e relutou para
que o padre os recebesse. Somente depois de muita conversa é que o bom Pedro concordou
com o novo presente.
Mas foi a última vez porque, poucos dias depois, em passos
ligeiros, o Padre Pedro passava em frente à loja, usando as inseparáveis batina
preta e bolsa ao lado, calçando sapatos velhos e rotos.
E concluía meu tio:
- Esse era
realmente um padre “santo”.
Aracaju, 29/06/2015
Beto Déda
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