terça-feira, 11 de agosto de 2015


       

O velho telefone do Aloque.

Nesta semana tomei conhecimento de que uma pessoa querida foi vítima de um motoqueiro delinquente que roubou seu telefone móvel celular.

Atualmente o celular passou a ter uso generalizado e os bandidos, diante da impunidade, deslizaram do furto para o roubo, ou seja, passaram – descaradamente e usando grave ameaça ou violência a pessoa – a subtrair coisa móvel alheia, para sí ou para outrem.

A lamentável notícia me fez pensar nas mudanças tecnológicas que ocorreram nestes últimos sessenta anos. 

Para os jovens de hoje – acostumados com a velocidade da informação via internet, utilizando o telefone celular, os modernos tablets e usufruindo uma imensa variedade de aparelhos sofisticados – difícil é imaginar como era diferente o nosso tempo de criança, em Simão Dias, no início dos anos 50.

Observando e usufruindo o conjunto de formidáveis mudanças, os setentões, como eu, não perdemos a oportunidade de lembrar como as coisas aconteciam em nossa infância.

Recordo-me que naquela época, em minha cidade, cozinhava-se exclusivamente em fogão de lenha; o uso de geladeira era limitadíssimo (aliás, só existia uma na casa de Dr. Aguiar e, parece-me, funcionava na base de querosene). No bar do Valério tinha uma câmara frigorífica, com salmoura, para fazer picolé e gelar refresco.

Era o tempo em que os estudantes das primeiras letras usavam lousa e lápis de pedra e os mais adiantados usavam pena e tinteiro.

A energia elétrica era rara, o uso mesmo era do candeeiro, da placa (tipo de lampião) ou da pretomax. A energia gerada pela usina de Paulo Afonso foi instalada em nossa cidade no ano de 1964.

Poucos automóveis trafegavam pelas ruas: o jipe de Dr. Salustino e o do Des. Gervásio, o caminhão, tipo pau-de-arara, de Antônio Barbadinho, que levava o pessoal para pegar o trem em Salgado, e o caminhão de carga chamado “luxinho” de Seu Joaquim Sotero.

O automóvel de aluguel era uma “fobica”, também conhecida como “ford bigode”, de Manuel Ventinha, um senhor narigudo que morava em frente  ADS(Associação Desportiva Simão-diense), clube que anos depois passou a ser chamado de Caiçara Clube. 




Naquela época não existia linha telefônica na cidade. Mas me lembro de que o tio Paulo Déda inovou, colocando um telefone de linha fixa entre o Aloque e a Sapataria. Era um telefone de parede, daqueles que se usava uma manivela pra fazer a chamada.

Naquele tempo, estimulados pela novidade do tio Paulo, brincávamos de telefone usando caixas de fósforo (parte em que ficam os palitos) interligadas por um pedaço de linha. Era uma experiência rudimentar de acústica e propagação de ondas sonoras, utilizando o principio adotado pelo italiano Antonio Meucci (reconhecido pelo Congresso dos Estados Unidos, em 2002, como o verdadeiro inventor do telefone, que antes acreditávamos ter sido inventado pelo escocês Graham Bell).

Era uma brincadeira comum dos garotos da época. O cuidado era esticar a linha de modo a facilitar a propagação do som. Um garoto falava próximo à caixa de fósforos, enquanto o outro colava a outra caixa ao ouvido.  

Foi justo em uma dessas brincadeiras que derrotei, com socos, um guri alto, chamado Zelito, que costumava me bater. Estava na Praça de São João brincando de telefone com o amigo Simão, quando apareceu o Zelito e quebrou a linha. Enfurecido e descontrolado esmurrei de tal forma o fanfarrão que, depois dessa, ele nunca mais me importunou. E esse fato ficou gravado em minha memória como o dia da desforra.
...

 Ainda sobre o telefone de tio Paulo; lembro-me que em 1969, quando fiz minha primeira viagem ao Rio de Janeiro, em conversa com minha saudosa prima Nice Déda – mãe de Eneide Déda e irmã de Necy – ouvi um relato interessante. Dizia ela que meu tio, logo depois de instalar seu telefone entre o cortume e a casa comercial, não perdia oportunidade de fazer gozação com as pessoas que usavam os vocábulos “linha” e “aparelho” (este último termo era sinônimo de telefone e de latrina). Minha prima narrava mais ou menos o seguinte:
Quando alguém ligava o telefone e indagava:

      - Alô! Quem está na linha?

O tio Paulo, com seu humor inconfundível, respondia:

     - O trem... O anzol... A agulha...

E complementava:

       - Você que está no “aparelho”: lembre-se de dar descarga depois de usá-lo...

E ria à beça

Aracaju, 03/08/2015          

Beto Déda

Nenhum comentário:

Postar um comentário