segunda-feira, 16 de março de 2020


Sonhando com o tempo que era jornaleiro.

Costumo dormir pouco, mas o tempo de sono é suficiente para sonhos bons e pesadelos.
Muitas vezes acordo assustado com pesadelos, possível efeito colateral dos medicamentos para o coração.
 Mas, na noite de ontem, não fui vítima de um sonho agitado.
 Minha madorna foi serena e alegre.
Sonhei com fatos dos anos cinquenta em minha terra: quando eu era o jovem jornaleiro que entregava o jornal “A Semana”, editado e dirigido por meu pai. O jornal circulava aos sábados, dia em que me acordava com os primeiros raios de sol surgindo no alto da Igreja Matriz. Andava por todas as ruas da cidade e conhecia cada casa e seus habitantes.
Meu caminhar era planejado: saía de uma rua para outra e voltava à redação do jornal para pegar nova braçada do semanário.  Lembro-me que em cada rua encontrava os que acordavam cedo e ansiosos aguardavam a entrega do jornal; eram pessoas idosas e que me recebiam com um largo sorriso. Uma recepção que, para mim, correspondia a um mundão de felicidade.
Mas, para a maioria dos assinantes, eu entregava o jornal colocando-o por baixo da porta da frente das casas.  Depois de percorrer todas as ruas da cidade e feita a entrega, aí então era a hora de tomar um bom café no Bar e Lanchonete do Seu Chico Bina, que ficava ao lado do Açougue Municipal.  Café forte e quentinho acompanhado de um delicioso pão amanteigado, que Seu Chico pegava na Padaria Central, de Seu Oscar Rocha.  Uma delícia!  Atualmente não fazem um pão tão bom, como antigamente.
Depois, voltava à redação do jornal para vender exemplares avulsos aos leitores da cidade e da zona rural. E eram muitos, todos meus conhecidos e bons amigos.
Lembro-me que uma vez um assíduo leitor, que também era colecionador do jornal, chegou tarde à redação e ficou muito triste ao saber que a edição daquela semana estava esgotada. Então ele me persuadiu a procurar na tipografia algum exemplar perdido. Atendi ao seu pedido e encontrei cópias iniciais de páginas separadas, que chamávamos “prova”, utilizadas para fazer as correções na arrumação dos tipos de chumbo. Passei para o interessado as páginas com rabiscos feitos por meu pai, indicando os erros na composição dos textos. Nunca esqueci o semblante alegre e agradecido daquele leitor.

Beto Déda distribuindo o jornal "A Semana"
pelas ruas de Simão Dias, nas manhãs frias dos dias de sábado.
(Montagem e traços do próprio) 
O sonho que tive ontem ativou minha memória.
 Embora não tenha fotografias da época que era jornaleiro, as imagens do sonho incentivaram-me a recortar fotos, rabiscar e fazer montagens de modo a retratar meus 14 e 15 anos, quando entregava “A Semana” nas manhãs frias do mês de julho, em Simão Dias, na primeira metade dos anos 50.

E, aqui pra nós, o resultado da fotomontagem me deixou feliz, especialmente por mostrar-me abraçando uma porção do querido jornal de minha terra.

O bom mesmo é que isto faz com que a alegria e o sorriso voltem à nossa mente, de modo a nos ajudar a afastar o pensamento da triste atualidade nacional e nos proteger da nefanda loucura praticada pelos que atualmente governam o país.

Aracaju, 16/03/2020
BETO DÉDA

6 comentários:

  1. Objetivo plenamente alcançado. Mais uma habilidade em sua vasta criatividade.

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  2. Sensacionais! Tanto o texto quanto a imagem.

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    1. Um abraço para meu querido Marco. A imagem foi produzida com recortes de fotos e uns rabiscos. Uma visão que tinha de mim mesmo nas manhãs de sábado em nossa terra. Um abraço.

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  3. Tio Beto, consegui imaginar você entregando jornal! Muito bom!

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    1. Olá Ana Paula. Bons tempos, não só porque estava na idade de pensamento livre, mas também porque fazia o trabalho brincando e adorava fazê-lo. Eu era um jornaleiro feliz. Um abraço.

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