quarta-feira, 20 de novembro de 2024

 O Dom da Virtude


Hoje, 19 de novembro, é uma data especial para Armandina (Creuza Armandina Déda) e Neto (José Febrônio de Araújo). Comemoram sessenta anos de feliz casamento. Um exemplo maravilhoso de união que transmitem para todos seus familiares.

Para comemorar tão importante data para o casal, os filhos planejaram um presente formidável: a edição de um livro biográfico de Armandina. E para fazer isto, contaram com a colaboração do historiador Jorge Bastos.  

Precedido de muita pesquisa e entrevistas, contando com a colaboração dos filhos do casal, o Prof. Bastos concluiu o trabalho, com um título que representa por demais a biografada: "O Dom da Virtude".

O livro será lançado na próxima sexta-feira, dia 22/11/2024, no Museu Digital Enedina Chagas, em Simão Dias. 



Mas uma importante informação se acrescenta ao referido lançamento. Para que isto acontecesse, Armandina fez uma solicitação que foi de imediato atendida pelos filhos: que toda a renda fosse revertida para o Instituto Ana Carolina, que cuida de crianças com síndrome de Down. Neste pedido nota-se o acerto do título do livro: Armandina Déda, o dom da virtude. 


Certamente este será um importante acontecimento que contará com a presença de nossos conterrâneos. 

Lá estarei para abraçar o ilustre casal Armandina/Neto e conversar muito com parentes, amigas e amigos.

Nos veremos lá.

Aracaju, 19/11/2024

Beto Déda


segunda-feira, 7 de outubro de 2024

 

Fatos da eleição de 1962, em Simão Dias: “Feijão de Cego”

 

 Ontem à noite, a ver o resultado das eleições para prefeito e vereadores, lembrei-me do que disse meu saudoso pai sobre a observação feita por Seu Nezinho de Antero – um agricultor simãodiense, “arguto e sério, fervoroso defensor da coerência partidária” – a respeito do resultado da votação eclética que aconteceu em Simão Dias, 07/10/1962.

Estava o Seu Nezinho acompanhando os trabalhos da apuração de votos e, notando que os eleitores não seguiram uma diretriz partidária, inconformado com a mistura, não se conteve e exclamou com indignação, em voz alta para que todos ali ouvissem: “Isto é um feijão de cego!”

 Meu pai procurou saber o sentido daquela afirmação e registrou o causo em interessante artigo: “Feijão de Cego”, publicado no jornal A Semana, edição de 20/10/1962. Repasso aqui aos amigos e parentes o referido texto.

 

 

FEIJÃO DE CEGO

(Contribuição para o folclore sergipano)

                                                                                                     

Escrito por Carvalho Déda (*)

 “Sempre fui enamorado do folclore. Membro da Comissão Sergipana de Folclore, colecionei, pacientemente, centenas de expressões populares, comparações, anedotas, historietas e acerca de um milhar de vocábulos não dicionarizados. Tudo isto guardei com avareza nos baús do ineditismo.

 Múltiplos afazeres me desviaram dessas atividades. Tornei-me descuidado, deixando escapar peças que enriqueceriam uma coleção para dar o que fazer aos pesquisadores do nosso folclore. Mas, porque o costume do cachimbo deixa a boca torta, não resisti ao sabor de uma expressão popular surgida no meio de numerosa assistência que acompanhava os trabalhos da Junta Apuradora do último pleito nesta Zona Eleitoral.

 A despeito da tensão política que tomava conta de todo o Estado, a Junta Apuradora desta zona desenvolvia suas atividades num ambiente de cordialidade e democracia. A vontade do povo era ali manifestada em cada cédula única ou em cada sobrecarta cheia de dobradinhas traquinas, que eram cantadas por diligentes escrutinadores. Eram as ecléticas que traduziam a indisciplina partidária, ou o desgaste dos partidos nacionais. Candidatos dos mais diversos partidos misturados nas sobrecartas opacas ou nos quadriláteros da cédula única.

Seu Nezinho de Antero, um camponês arguto e sério, de olhos miúdos e rasgados, com pinta de filósofo de roça, fervoroso defensor da coerência partidária, disciplinado por índole e por tradição de família, escutava com desencanto o decorrer da apuração. A cada eclética cantada, Seu Nezinho torcia o beiço, abanava a cabeça, ou dava um tunco em sinal de reprovação.

A certa altura, Seu Nezinho não se conteve. Passou a mão pelo rosto imberbe e exclamou em retirada: - Isto é um feijão de cego!...

 A expressão buliu no meu fraco de folclorista. Abandonei lápis e notas de apuração e corri atrás do Seu Nezinho: -Homem, que diabo vem a ser feijão de cego?

 O filósofo sertanejo respondeu com uma explicação que encerra profunda filosofia popular e ao mesmo tempo retrata com fidelidade o panorama partidário deste país:

- Se o senhor quer saber, vá ao mercado do feijão e observe as esmolas recolhidas por um mendigo cego. Estirando a mão à caridade dos comerciantes do cereal, o cego vai recebendo, no fundo da cuia, de saco em saco, as diversas esmolas. Logo mais a cuia estará cheia de feijão, mas numa mistura chocante de grãos: feijão preto, feijão branco, feijão roxo, feijão mulatinho, feijão pintadinho, feijão grande, feijão miúdo, feijão sempre-verde, feijão pisa, feijão de corda etc. etc. As qualidades do cereal se confundem na cuia do cego, tirando-lhe o sabor. É isto que se chama feijão de cego.

 E arrematando a pitoresca observação, o filósofo tabaréu fez a notável comparação: - o que estou vendo naquela apuração de votos é um feijão de cego. Uma mistura que tira o gosto do voto e da política também. Hoje em dia não vale a pena votar.  Eleitores não seguem os correligionários, os chefes políticos não obedecem aos partidos, os partidos não têm rumos certos e se misturam miseravelmente como feijão de cego!

Realmente, Seu Nezinho tem razão. Os partidos nacionais e os sufrágios populares se tornaram num autêntico “feijão de cego”.

 Sem querer, Seu Nezinho ofereceu uma preciosa joia ao folclore sergipano.”

(*) Carvalho Déda, jornalista, folclorista, escritor, advogado e político. Artigo publicado no jornal A SEMANA, de Simão Dias (SE), edição de 20.10.62.

...

 Qualquer semelhança desse artigo com os fatos atuais é mera coincidência.

 

Aracaju, 07/10/2024

Beto Déda 

 



terça-feira, 24 de setembro de 2024

O aguadeiro, o rezador e a Praça dos Três Poderes em Simão Dias.

 

Desde criança sou um impertinente perguntador, mas não sou um fofoqueiro. Minha curiosidade é sadia, com pretensão de conhecer os detalhes daquilo que me interessa.

Dessa forma, quando um fato me deixa dúvida, nunca tenho acanhamento de fazer perguntas. Isto favoreceu o desempenho de minha memória, guardando acontecimentos dos bons tempos de minha cidade. Mas não guardo só para mim os fatos interessantes que estão guardados em minha cachola. Gosto de repassá-los para os amigos que tem tempo e paciência para meus longos textos.

No correr desta semana relembrei-me do tempo que nossa cidade não contava com água encanada, e o fornecimento do precioso líquido era realizado por aguadeiros, que realizavam o transporte, em barris ou latas de 20 litros, no lombo de jumentos. Nas residências existiam os porrões (grandes potes de barro), utilizados para armazenar a água proveniente de açudes localizados na periferia da cidade.

Conheci alguns aguadeiros e deles retive algumas histórias. Narro agora um causo de um senhor moreno, altura média, magro, olhos miúdos, um bigode alinhado e que usava um colar de búzios no pescoço, dizendo ser sua proteção contra os "maluficios". Era o aguadeiro "Bigodinho”, que diziam ser muito esperto.

Seu trabalho era transportar água da velha represa do Bairro Areal para as residências localizadas no entorno da antiga Rua da Feira, a atual Avenida Cel. Loiola. Sua tropa de transporte era composta por três jegues; o que andava na frente era chamado de "Chefim", enfeitado com fitas coloridas e com guizos em volta do cabresto, produzindo um som característico para guiar os outros animais.

Bigodinho dizia-se crente de rezas benfazejas e sempre procurava o Mestre Zinho, conhecido na cidade como um confiável rezador e vidente, para lhe tirar mal olhado e benzer o colar de búzios.

Certa vez, o aguadeiro foi à casa do Mestre Zinho e, depois de ser benzido, ouviu do rezador uma advertência: Cuidado com suas façanhas, noto nuvens perigosas sobre sua cabeça...

Ao pronunciar o termo façanhas, o velho vidente se referia aos rumores de que o aguadeiro tinha o costume de se apropriar indevidamente de galináceos, invadindo quintais alheios.

Pois foi justamente o que aconteceu poucos dias depois. Os mexericos no meio dos aguadeiros era de que, naquela noite, o Bigodinho resolveu invadir um galinheiro na estrada do Areal. Pegou um gordo peru de um agricultor, montou em seu jegue e, quando saía, ouviu o disparo de espingarda tipo “pica-pau”. Então, levantando o peru com a mão direita, atiçou a disparada e gritou a todos pulmões: - Ceva outro desse, seu mão de vaca, que eu volto para pegar! Em resposta, novos tiros foram disparados, mas não o atingiram.

Dias depois, certamente lembrando-se da advertência do benzedor, foi à sua procura para nova reza e mais uma vez reativar a força de seu cordão de búzios.

A nova benzedura foi demorada, com muitos bocejos do rezador. O abrir involuntário de boca indica a sobrecarga de males que sombreiam o benzido.   Então, ao terminar a reza, enquanto recolhia o galho de arruda, o Mestre Zinho olhou com firmeza para o aguadeiro e disse que ele tomasse todos os cuidados, isto porque, no trabalho de descarrego, pressentiu espectros do mal rondando-lhe, estampando um futuro penoso na Praça dos Três Poderes.

Sobre o nome desse logradouro, vale uma explicação. A antiga Praça de São João, ou Parque José Zacarias de Carvalho, hoje denominada Praça José Barreto, também era apelidada pelos populares como “Praça dos Três Poderes”, isto porque ali estavam os prédios de três importantes instituições públicas: o velho quartel de Polícia (no local que hoje é o Memorial da Cidade); o antigo Hospital Bom Jesus (parece-me, não tenho certeza, que atualmente o local está abandonado); e o Cemitério São João Batista. Dessa forma, os populares d’antanho justificavam o novo nome, esclarecendo que, em caso de briga violenta, certamente os contendores iriam parar em um dos tais poderes existentes naquela praça: cadeia, hospital ou cemitério. Daí o sentido da nova advertência do Mestre Zinho.

À direita: o Quartel de Polícia; a  entrada do Hospital Bom Jesus e, ao fundo, o Cemitério São João Batista, na popular e antiga Praça dos Três Poderes, em Simão Dias. ( Foto de 1989, por Beto Déda).


O aguadeiro pensou, mas deu diminuto crédito à advertência do vidente. Estava crente no poder do seu cordão de búzios.

Passados alguns dias, Bigodinho planejou “visitar” a bodega de Zé Calado, um senhor idoso, calmo e muito paciente, que nunca falava de seu instinto forte e coragem para e enfrentar situações difíceis. O bodegueiro morava com a mulher (Dona Flora) na própria bodega. Fora da lide comercial, eles costumavam frequentar as festas religiosas e também os leilões e reisados, realizados com certa frequência naquela época.

Com o anúncio de que seria realizado na noite de uma sexta-feira um baita reisado na região e certificando-se que lá estariam presentes Seu Zé Calado e dona Flora, Bigodinho decidiu concretizar seu plano no decorrer da referida festividade.

Planejou entrar na bodega pela porta dos fundos, onde estava a cozinha do casal comerciantes. Ali a parede era de taipa, o que facilitaria o arrombamento. Assim pensou e assim o fez.

Passou entre os arames da cerca e foi direto para a porta dos fundos da bodega. Percebeu que a porta estava fechada com um pau de travessão. Então começou a cavar um pequeno buraco na parede de taipa para meter o braço e tirar o travessão que trancava a porta.

Feito o buraco, enfiou o braço para pegar o travessão... Então surgiu o imprevisto: seu braço ficou preso, torcido e amarrado por alguém que estava no interior da casa. A situação ficou feia, sofrendo a dor no braço, preso na parede, o danado gemia baixinho e praguejava sem sucesso: “Solta, fi da peste”...

Dentro da casa estavam Zé Calado e sua mulher, arrochando o nó da corda para amarrar o braço do invasor e imobilizá-lo no lado de fora, colado à parede.

O que Bigodinho não sabia é que, no início da noite, Dona Flora estava adoentada, de modo que o casal desistira de ir ao leilão. Foram para cama cedo.

Horas mais tarde, ao ouvir o som estranho na cozinha, Dona Flora acordou o marido. Com as devidas cautelas, silenciosos, foram até o local e notaram que estavam arrombando a parede de taipa. Pacientemente esperaram e, quando o invasor meteu o braço no buraco da parede, Seu Zé o agarrou fortemente e D. Flora amarrou a um pedaço de madeira.

O Bigodinho passou a noite gemendo, em pé, quase pendurado à parede, com o braço preso no interior da casa.

Ao amanhecer, chamaram a polícia e levaram o penetra para a cadeia situada na Praça dos Três Poderes da cidade, passando primeiro pelo Hospital Bom Jesus, onde recebeu os primeiros curativos necessários no braço inflamado. O triste presságio do rezador estava se tornando realidade.

Passados dois dias da prisão, atendendo pedidos, Mestre Zinho foi visitar o desditoso arrombador. Após alguma conversa, o rezador perguntou onde estava o cordão de búzios, e o prisioneiro passou a mão no pescoço e sentindo a falta, fez um gesto de espanto e lembrou que, ao passar pela cerca para ir à casa do Zé Calado, o cordão enganchou no arame farpado e partiu. Na pressa para realizar seu indigno plano, esquecera de apanhar o amuleto.

Na conversa com o rezador, Bigodinho tristonho, envergonhado, lamentava não ter ouvido os conselhos do velho vidente e, triste, repetia como se rezasse uma ladainha: “Infelizmente essa era a minha natureza…”, e complementava: “Não acontecerá novamente...”.

A prisão do conhecido aguadeiro foi motivo de muitos comentários naqueles dias. Logo sugiram rumores de outros casos de arrombamento que passaram a atribuir ao infeliz prisioneiro. Muitos asseguravam se tratar de um larápio contumaz.

Entretanto, como sempre acontece, surgiram fortes controversas sobre os motivos do mal proceder do aguadeiro.

Para o Mestre Zinho, o destino reservou um caminho triste e medonho para Bigodinho, pressionando-o a ingressar no mundo da delinquência.

Conversei e muito perguntei ao referido rezador e ele, pacientemente, me contou que conhecia a vida do infeliz aguadeiro. Assegurou-me que era um homem honesto, que cuidava com muito esforço de sua família, constituída da mulher e  cinco crianças. Trabalhava duro, levando água para as residências. Era o que sabia fazer. No inverno, com muita chuva e as cisternas e os porrões das casas cheios, ele ficou sem trabalho.

O rezador complementava que o Bigodinho, sentindo que lhe negavam outro serviço e sem condições de alimentar sua família, lamentavelmente prestou-se a arrebatar dos outros o que lhe faltava.

O desditoso aguadeiro permaneceu um longo período vendo o sol quadrado, enquanto aguardava o vagaroso processo que o condenou. Dizem que ele entrou em uma forte depressão e, amargurado, arrependido, remoendo seus erros, sofreu uma aguda dor no coração, com morte súbita.

Foi assim que o Bigodinho passou pelos famosos prédios vizinhos que justificaram o nome popular da antiga “Praça dos Três Poderes” em Simão Dias, o hospital, a cadeia e o cemitério, tudo conforme previra o velho rezador.

Ao fim e ao cabo, deixou a família aos cuidados da pobre esposa, que penou o resto da vida, trabalhando a duras penas na represa do Areal, lavando roupa para famílias do bairro. Mesmo assim, conseguiu honestamente criar e educar seus filhos e filhas, contando com a ajuda de pessoas bondosas do bairro em que viviam.

Aracaju, 23/09/2024

Beto Déda


segunda-feira, 2 de setembro de 2024

O Programa “Rotary no Ar”, transmitido pela Rádio Simão Dias FM 87,9, e as lembranças da “Tupy” dos anos 1950.

 

 Sempre reservo as noites de segundas-feiras para acompanhar o programa “Rotary no Ar”, comandado pelos caros conterrâneos Alexandre Júnior e Almeida, transmitido pela Nova Rádio Simão Dias FM 87,9.

Trata-se de um interessante programa que evidencia a atualidade de nossa terra, realizando entrevistas importantes, abordando assuntos locais, que cativam o interesse dos simãodienses, de modo especial os que residem em outras paragens.  

Ressalte-se, aqui, o inteligente desempenho dos entrevistadores, de modo especial o Professor Alexandre Barreto Júnior, que com sabedoria faz indagações pertinentes, demonstrando conhecimento e alicerçada cultura.

 Programa "Rotary no ar" (foto Facebook)


O fato é que o programa repercute muito bem; e isto se comprova pela participação frequente daqueles que o acompanham, externando opiniões ou relembrando acontecimentos locais. Nota-se que conterrâneos de várias partes do país estão atentos, ávidos por notícias da terra, e que marcam sua presença dialogando com Almeida e Alexandre.  

Como gosto de relembrar causos dos bons tempos de minha juventude, recordo aqui do serviço de alto-falantes denominado “Tupy”, que funcionava em Simão Dias, nos anos 1950.

A “Tupy” era dirigida por Demerval Guerra e tinha como locutores: Floriano Nascimento, Almir Fontes e o próprio Demerval. A transmissora funcionava na antiga Rua do Coité, hoje denominada Rua Pres. Vargas, próxima à casa que era do Dr. Belmiro Gois.

Local onde estava a sede da antiga Tupy na antiga Rua do Coité,

                                atual Rua Pres. Vargas (foto Gloogle.com/maps).

O serviço de som era transmitido por alto-falantes localizados em pontos estratégicos da cidade. Lembro de alguns deles: na Rua do Coité, em frente ao bar de Valério; no Bairro Bonfim, em frente à casa de Dão Rodrigues; na Rua do Pastinho, em frente à tenda de Seu Caboclo, e na antiga Rua da Feira - atual Av. Cel. Loyola – entre a Loja de Elisa Montalvão o antigo Prédio da Prefeitura Municipal, onde hoje funciona o Banco do Nordeste.

Durante um curto espaço de tempo, as transmissões da “Tupy” eram captadas na cidade através de aparelhos de rádios, conforme me informou o saudoso amigo Floriano Nascimento, em entrevista em vídeo, que gravei e postei no meu site no Facebook, em 28-11-2016. O técnico responsável pela transmissão radiofônica foi o conterrâneo Gamaliel Hipólito dos Santos, que tinha uma oficina localizada na frente da Rua da Calçada Alta, atual Rua Aurora.

A “Tupy” tinha uma programação formidável: cultural, informativa e divertida, com leituras de artigos de jornalistas da cidade e muita música. Os jovens pagavam uma pequena taxa para transmitirem mensagens, transmitidas pelos locutores, dedicando canções de artistas de sucesso: Emilinha Borba, Orlando Silva, Marlene, Elizeth Cardoso, Dalva de Oliveira, Sílvio Caldas, Carlos Galhardo, Ângela Maria e Ataulfo Alves.

Os rapazes trocavam delicadezas com as moças, oferecendo músicas e enviando mensagens românticas codificadas. E eu participei também.

Pois é... Participei, sim! E para não esquecer, recordo com saudade daquela noite alegre que fui até a sede da “Tupy” e, com timidez, aproximei-me do balcão e entreguei um bilhete, dedicando uma música para minha primeira namorada. E fiquei atento, esperando que transmitissem a minha mensagem e tocassem a música escolhida.

Com um sorriso largo, olhando a garota a pouca distância, ouvi o inesquecível timbre de voz do Floriano Nascimento, ao anunciar minha mensagem:

 - Para a garota de olhos meigos da Rua ....... (depois de mencionar o nome da rua, fez um uma ligeira pausa e complementou): vai esta canção que lhe dedica um jovem admirador...

 E rolaram o disco de Sílvio Caldas: “A Deusa da minha rua”.

Aconteceu, então, a apoteose do meu devaneio, ao perceber o leve sorriso da linda garota dos olhos meigos aprovando meu galanteio...

...

Enfim, vale afirmar que daqui do meu cantinho, envio o meu abraço agradecido aos queridos conterrâneos Alexandre Júnior  e Almeida por cuidarem de tão importante programa e por me despertarem agradáveis recordações.

Aracaju, 01/09/2024

Beto Déda

quinta-feira, 15 de agosto de 2024

 

Lembranças de um jornaleiro: os populares nomes das ruas de Simão Dias e seus moradores.

 

No último texto que postei neste espaço, ao mencionar as imagens da procissão em louvor a Nossa Senhora Santana, padroeira de Simão Dias, informei que me lembrava do nome antigo de cada rua da cidade e de seus moradores.  

Pois bem, neste último domingo, conversando com uma amiga conterrânea  sobre o que escrevi, ela se mostrou admirada e, também, demonstrando certa dúvida, me fez a seguinte indagação:  

- Seu Beto, sua memória guarda realmente essas lembranças?

Respondi que sim, e apresentei exemplos, associando as denominações atuais das ruas – expostas nas legendas dos vídeos que mostravam o roteiro da procissão em homenagem à nossa padroeira – aos nomes populares que antigamente nosso povo adotava com base em algum acontecimento local. E a minha amiga, com espanto e sorriso, ouvia atentamente quando eu mencionava o nome popular de cada logradouro. Aqui estão alguns deles: Rua dos Buracos, Rua do Alambique, Rua da Ponta da Asa, Rua da Lama, Rua dos Pinicos, Rua da Ilhota, Rua do Comércio Velho, Rua do Mulungu, Rua da Tripa, Rua das Sete Casas, Rua das Louceiras, Rua da Calçada Alta, Rua do Pastinho, Rua dos Ribeiros, Praça de São João, Rua do Curral, Rua da Palha, Rua da Santa Cruz, Rua do Coité, Rua da Canafístula, Rua do Sobrado, Rua da Feira, e assim seguia...     

Em sequência, também informei que, ao observar a fachada de cada casa, lembrava o nome das famílias que ali moravam. Então mencionei o nome de saudosas pessoas que ali residiam nos velhos tempos, e que aqui não caberia relacionar, devido ao grande número.  

Diante da admiração de minha interlocutora, fiz ver que esta minha lembrança é decorrente do tempo que era o garoto  jornaleiro da cidade, lá pelos anos 50, quando, nas primeiras horas das manhãs dos dias de sábado, eu distribuía pelas ruas o jornal A Semana, editado por meu pai. Pela quantidade dos assinantes do jornal, também não dá para mencionar todos aqui.

O jornaleiro Beto Déda distribuindo o jornal "A Semana"(Montagem e traço do próprio Beto).


Mas não deixei de mencionar alguns leitores assíduos que, aos sábados, cedinho, já estavam na frente de suas casas, aguardando-me para receber o semanário. Cito, a seguir, os que no momento me lembro: na Praça da Matriz, o Dr. Fraga Matos, cirurgião-dentista (marido de D. Celina e pai de Maria Auxiliadora e de Dr. Gilson e Dr. Gildo Fraga); na Rua de Estância, Dr. Alceu Conceição, também dentista (irmão do empresário Durval Conceição, que construiu o Cine Brasil); na Rua do Coité: invariavelmente dois assinantes me aguardavam:  D. Aldina Guimarães (mãe de Barbosa Guimarães e avó de Clínio), e Seu Antônio Gomes, funcionário do fisco estadual, (pai de meu amigo contemporâneo Simão Dias Gomes);   na Rua da Feira, Seu Inocêncio Nascimento, comerciante de tecidos (meu padrinho); na Rua da Canafístula, Seu Zuzu, mecânico que cuidava da Usina Elétrica da cidade; na Rua do Comércio Velho, o Mestre Raimundo Macedo Freitas, maestro da Lira Santana; na Rua do Pastinho, seu Coelho (não lembro o nome completo, mas era um senhor baixo, de cabelos grisalhos, olhos miúdos); na Rua dos Ribeiros: Seu Pierre Freitas, dono do Cine Ypiranga (pai da Prof. Virgilinha Freitas); na Rua do Mulungu, o Sr. Demétrio Oliveira, comerciante (que gostava de publicar charadas no jornal); e, na Rua da Lama, Seu Gabino, comerciante. Mencionei aqui apenas os que me aguardavam para receber pessoalmente o jornal. A entrega da maioria dos assinantes era feita colocando o jornal por baixo da porta das respectivas casas.

De tal forma minha amiga ficou entusiasmada com minhas recordações que me fez ver a importância de preservar, por escrito, as informações que tenho em minha memória. Concordei e prometi relacionar por escrito.

Devo informar que, há alguns meses, tinha recebido uma sugestão semelhante de minha querida amiga Professora Amanda Santos, que faz o Curso de Doutorado na Universidade Federal da Bahia.

Como promessa é dívida, para fazer isto terei que viajar, oportunamente, até minha terra natal e lá, com ajuda da historiadora Amanda, percorrei o roteiro que eu usava quando era jornaleiro, anotando o nome atual e o antigo de cada rua da cidade e, também, observando a fachada de cada casa, para registrar o nome das famílias que ali residiam.  

Mas isso não será imediato. Tudo será no tempo certo; sem pressa.

Então, minha amiga, é só ter paciência e aguardar.

Aracaju, 15/08/2024

Beto Déda


segunda-feira, 5 de agosto de 2024

O dia dos avós, a festa de Santana e tia Nice Enfermeira.

 

Neste ano não foi possível comparecer à festa de Nossa Senhora Santana, padroeira de minha terra, que ocorreu no dia 26 de julho. Mas justifico minha falta. Naquele mesmo dia, tínhamos um compromisso inadiável com meu querido neto Miguel: comparecer ao colégio em que ele estuda, onde prestariam homenagens a todos os avós dos alunos.

O colégio fez uma interessante cerimônia, porém, o melhor mesmo aconteceu na sala de aula, quando interagimos alegremente com a classe e recebemos aquele abraço afetuoso do amado neto.


O dia dos avós no colégio de meu neto.

                                  

O encontro dos avós aconteceu pela manhã daquele dia, o que certamente daria tempo para uma viagem até Simão Dias, mas surgiu o problema dos percalços de minha idade: não me agrada, e não me convém, dirigir veículo fora de Aracaju. Então resolvi cancelar a viagem e ficar em casa. Mesmo assim, não me descurei de ficar atento aos acontecimentos de minha terra natal. Acompanhei a festa por uma emissora local que transmitia imagem e som, via internet, pelo YouTube.

A festa de Santana em  Simão Dias (foto do vídeo em que aparece a Praça da Matriz e a antiga Rua do Coité.


Ao acompanhar o roteiro da procissão religiosa dos conterrâneos pelas ruas de Simão Dias, minha memória espontânea despertou, fazendo-me reviver momentos de emoção ali vividos em outros tempos. A legenda dos vídeos indicava a denominação atual de cada logradouro que passava, enquanto minhas lembranças retroagiam, lembrando o nome antigo e popular de cada rua e, observando a fachada de cada casa, recordava-me das famílias que ali residiam. 

Quando notei a imagem da procissão passando pela antiga Rua do Coité, e vendo a frente da casa que morou minha saudosa tia Nice, (conhecida como Nice Enfermeira) a emoção me atingiu e as lágrimas não foram sufocadas.  

Recentemente essa lembrança foi despertada por minha prima Armandina Déda, que me pediu para escrever um texto com dados biográficos sobre minha querida tia Nice. Atendi com presteza, escrevi o texto, que agora relembro e aqui repito alguns dados  para os meus parentes e amigos. 

O nome completo de minha tia era Eunice Barbosa de Oliveira. Ela nasceu na cidade de Riachuelo (SE). Ainda jovem ficou órfã e passou a conviver com a família de minha avó materna (Adele Accioly Oliveira) que era tia dela.  Assim ela era prima\irmã de minha mãe (Sinhazinha Déda), e nossa querida tia.

Tia Nice no centro (foto do lançamento do livro sobre história de Simão Dias.


Muito religiosa, pretendia ser freira e foi para um convento em Salvador (BA). Lá, como noviça, aprendeu muito e dedicava atenção especial às atividades de enfermagem, que praticou em hospitais daquela cidade. Depois de alguns anos, compreendeu que não suportaria a vida no convento e desistiu de ser freira.

Voltou para Sergipe e foi morar em Simão Dias na companhia dos familiares que, em anos anteriores, ali fixaram residência advindos de Riachuelo.

Diante de seus conhecimentos de enfermagem, passou a trabalhar no Posto Estadual de Saúde, como funcionária pública do Estado. Não era uma simples funcionária. Portando sua pastinha com estojo de emergência, ela andava de casa em casa prestando socorro aos mais necessitados. Naquela época, as seringas e agulhas não eram descartáveis; toda vez que ela ia aplicar uma injeção, tinha que esterilizar a seringa de vidro e a agulha, em água fervendo, e fazia isto usando o estojinho de metal, que era aquecido com álcool queimando na tampinha do estojo.

Era carinhosamente conhecida na cidade como “Nice Enfermeira”.

Após começar sua carreira como funcionária pública, ela alugou uma casa perto do antigo clube social ADS (Associação Desportista Simãodiense), que posteriormente passou a se chamar Cayçara Clube.

Anos depois mudou-se para a antiga Rua do Coité, em uma casa vizinha à de Dr. Manoel Aguiar. 

Naquela época, por recomendação de minha mãe, eu e meus irmãos Artur Oscar e Carlos Eugênio, nos revezávamos para dormir na casa da tia Nice. Lá eu cresci e morei enquanto era solteiro. Durante alguns anos meu sobrinho Marcelo Déda também morou conosco, quando os pais dele se mudaram para Aracaju  e permitiram que ele ficasse em Simão Dias, para terminar o curso primário no Grupo Escolar Fausto Cardoso. Tia Nice nos tratava com um cuidado especial e adorava Marcelo, que a retribuía com carinho e muita atenção, chamando-a afetuosamente de tia Didi.

Ela deixou o hábito religioso, mas não perdeu a fé. Era muito católica e fazia parte do grupo de “Filhas de Maria” da paróquia da cidade e nos orientou nos ensinamentos da Igreja Católica. Em companhia dela, eu e Marcelo participávamos de todos os atos realizados na Matriz de Senhora Santana: catecismos, missas, novenas e nas noites de oração ao Santíssimo Sacramento. Para Marcelo sua influência foi maior, ele se tornou “Coroinha” e durante sua vida foi um cristão de muita fé.

Em 1982, tia Nice ficou preocupada quando soube que Marcelo estava iniciando na política. E sorriu quando soube que ele tivera apenas 296 votos na eleição daquele ano para Deputado Estadual pelo PT. Ela faleceu antes de Marcelo despontar como admirável político.

Tia Nice dedicava-se com muita atenção e boa vontade ao seu trabalho como enfermeira, atendendo com presteza a todos que a procuravam, independentemente da hora. E não disfarçava a emoção e solidariedade que tinha com cada pessoa que atendia. Lembro-me que certa vez, logo depois das 6:00 horas da manhã, quando ela preparava nosso café, chegou uma senhora aflita, chorando, pedindo socorro para um filhinho desvanecido que trazia nos braços, vítima de crupe. Minha tia, ao notar que a criança não mostrava sinais de vida, olhou comovida para a sofrida mãe, balançou a cabeça como se dissesse que nada podia fazer e começou a chorar e a rezar. Nunca esqueci aquela triste cena em que ela, a mãe do menino – e eu também – chorávamos e rezávamos emocionados.

O trabalho dela sempre foi reconhecido pelos simãodienses e foi homenageada pela Prefeitura da cidade ao colocar o seu nome no posto de saúde municipal, localizado na Rua Dr. Manoel Salustino Neto: “Clínica de Saúde EUNICE BARBOSA DE OLIVEIRA”.

Da mesma forma foi homenageada pela Secretaria de Saúde do Estado, ao denominar o posto de Saúde do Bairro Coqueiral, em Aracaju, com seu nome: “Unidade de Saúde EUNICE BARBOSA DE OLIVEIRA”.


Para mim, neste ano, ao comemorarmos o dia dos avós e a festa em louvor a Nossa Senhora Santana, também foi um dia de prestar minha homenagem à querida tia Nice Enfermeira que, não tenho dúvida, será sempre lembrada como personalidade importante na área de saúde de minha terra.

 Aracaju, 05/08/2024

Beto Déda




segunda-feira, 15 de julho de 2024

Novas lembranças do saudoso amigo Átila Lisa.

 

Sexta-feira passada, quando ocorreu a solenidade de lançamento da pedra fundamental da nova sede da Polícia Federal em Sergipe, nossas lembranças mais vez se voltaram para o saudoso amigo Átila de Meneses Lisa, que foi homenageado como um dos agentes pioneiros da Polícia Federal e integrante da corporação de Sergipe desde 1960.

O Agente Flávio Lisa discursa na solenidade de lançamento da Pedra Fundamental da nova sede da Polícia  Federal

Reconhecendo os serviços que prestou à cidade, o Município de Aracaju denominou o logradouro de acesso à futura Sede da Polícia Federal, no Bairro Coroa do Meio, com seu nome: “Rua Agente Federal Átila Lisa”.

Flávio, Carla e meus netos (Miguel e Marina) ao lado da placa em homenagem a Átila Lisa.

O Sr. Átila nasceu em 12/01/1940, dedicou sua vida laboral a serviço de segurança pública federal. Ainda jovem, serviu ao Exército e, logo depois, sendo reconhecido pelo seu bom desempenho e comportamento, foi trabalhar  na Companhia de Polícia do Exército de Salvador. Em seguida, foi para Brasília integrar o DFSP (Departamento Federal de Segurança Pública), que é a atual Polícia Federal. Na segunda metade dos anos 60 ele veio para Aracaju e aqui ficou até 12 de outubro de 2012, quando partiu para o plano celeste.

Conheci Seu Átila quando ele já estava aposentado, mas percebi que ele sempre teve um coração magnânimo e muito senso de justiça. Esta minha opinião é confirmada pelos que conheceram seu trabalho. Ele foi um exemplo como cidadão, esportista e como policial que sempre defendeu os Direitos Humanos. Com seu jeito humilde, cativava as pessoas e, assim, fez um grande círculo de amizades em Aracaju.

No campo esportivo, ele era um mestre no jogo de futebol de mesa (futebol de botão). Começou quando tinha 12 anos de idade e participou de diversos campeonatos realizados nos bairros de Salvador, sua cidade natal. Aqui em Aracaju, ele teve atuação formidável: foi Vice-Presidente da Liga Sergipana Futebol de Mesa por muitos anos e incentivador da organização daquele esporte no Brasil. Sua participação como atleta será sempre lembrada: campeão de diversos torneios “Nordestão” e, em 1970, ganhou o troféu como vencedor do Primeiro Campeonato Brasileiro de Futebol de Mesa.

 Lembro, agora, que em novembro de 2012, Seu Átila foi homenageado em Salvador, pela FBFM(Federação Brasileira de Futebol de Mesa), na abertura do Campeonato Nacional. Eu estava lá, a passeio, e me emocionei com a beleza da solenidade.  Sobre a homenagem escrevi um texto, em 19/11/2012, e postei meu blog (carlosalbertodeda.blogspot.com).

Flávio e Miguel (meu neto) ao lado do cartaz em  homenagem a Átila Lisa, novembro de 2012.

O saudoso amigo ao desencarnar, deixou sete inteligentes filhos: Alan, Alex, Flávio (meu querido genro), Charles, Sueli, Arley e Marcos Paulo. Transmitiu para eles uma boa educação e estímulo aos esporte. Os filhos são pessoas excelentes e conhecidos como aplicados atletas de futebol de mesa, que se destacam em campeonatos regionais e nacionais; e Flávio Lisa também já foi campeão brasileiro. Seguindo orientação do pai, Flávio e Alex também se tornaram Agentes da Polícia Federal.

Para o filho Alex Lisa, seu pai era um mestre e os filhos, desde pequeninos, aprenderam com ele importantes lições que os prepararam para a vida.

Do meu genro, Flávio Lisa, lembro essas emocionantes palavras:

“Ele sempre era conselheiro, torcedor fanático e entusiasta dos filhos. Uma certa feita, já nos seus últimos dias no hospital, em uma das frias e difíceis madrugadas, ele me chamou ao lado do leito e disse: “Meu pai (assim me chamava carinhosamente), pegue o meu troféu de Campeão Brasileiro e coloque na sua estante de troféus, que ele atrairá o seu...”

Não deu outra, pouco mais de um ano da sua passagem, eu subiria ao topo do pódio para ser Campeão Brasileiro, em novembro de 2013. A sua influência sobre mim foi tão marcante que segui a mesma profissão e desenvolvi o mesmo amor pelo mesmo esporte. Átila Lisa, meu herói, meu exemplo, meu amado pai, homem que sempre pregava e usava a palavra GENTILEZA”.

Justa e merecida homenagem que a comunidade aracajuana presta ao saudoso ÁTILA DE MENESES LISA.

Transmito aqui meu abraço a todos familiares, vez que, infelizmente, não pude comparecer à solenidade da pedra fundamental. E ativando estas minhas lembranças, certamente Seu Átila, no sagrado lugar que se encontra, com razão, deve ter repetido uma frase que sempre usava quando notava uma falha: “Isso foi uma Falta Técnica!

Aracaju, 15/07/2024

Beto Déda

 

terça-feira, 4 de junho de 2024

 

Um prêmio de consolação.

 

Muitas vezes um fato arquivado em nossa memória é despertado por um sonho seguido de uma simples palavra dita por alguém, como se ocorresse uma sincronicidade de pensamentos. 

Um dia desta semana, sonhei que estava feliz porque tinha sido ganhador de um prêmio. Pela manhã, estava em um Supermercado e encontrei-me com um antigo colega, que lembrou do tempo que ganhamos uma medalha por ter participado do time de futebol de salão do Colégio Atheneu. Embora não fosse titular, participei de algumas partidas como primeiro reserva.

Entre o meu sonho e a lembrança do amigo, aconteceu a “sincronicidade”, ou seja, um fenômeno descoberto pelo psicólogo suíço Carl Jung, ao estudar a relação significativa não causal entre dois fatos. Para aquele psicólogo “a sincronicidade revela a conexão significativa entre o mundo subjetivo e o objetivo”.

E para complementar essa conexão, quando chequei em casa e fui guardar um documento na gaveta da escrivaninha, vi um chaveiro e, mais uma vez, a memória foi despertada para um prêmio que recebi no final dos anos cinquenta. Repasso, com detalhes, como aconteceu esse prêmio.

Era tempo de férias, acordei-me cedo e calcei meu tênis tipo basqueteira – daqueles que tinham o cano longo e, ao lado do tornozelo, um pequeno protetor de borracha, com o nome do fabricante – e fui à redação do jornal A Semana. Era uma manhã ensolarada e, lembro-me como se fosse ontem, me alegrei quando vi a beleza dos raios do astro rei descendo inclinados ao   longo da Rua do Coité, em Simão Dias.  

Assim que cheguei na redação do jornal, passei a ler um almanaque ou a  revista “Seleções - Reading Digest” -  não estou seguro quanto à fonte - foi quando notei um anúncio de um órgão associado à Embaixada Italiana, que informava um concurso literário de redação. Fiquei interessado e resolvi concorrer.

Associei imediatamente a Itália à rua que nasci (antiga Rua dos Ribeiros), onde viveu nos velhos tempos um italiano que tentou mudar a denominação daquele logradouro. Embora o fato não tenha ocorrido no meu tempo, tomei conhecimento ao ouvir relatos de meu pai.

Antiga Rua dos Ribeiros que um italiano tentou mudar a denominação(Foto do acervo de Beto Déda)


Cuidei então de fazer o texto, descrevendo o estrangeiro e sua passagem por minha terra natal.

Como não tinha conhecido aquele gringo, usei a imaginação para descrevê-lo, me inspirando em um ator italiano, que não me lembro o nome, mas sua fisionomia estava presente nos seriados que passavam no Cine Ypiranga.  Usei a criatividade para dizer de suas atividades na cidade e o modo como tentou alterar o nome da rua que morava. Contava-me meu pai que o italiano fazia questão de demonstrar seu patriotismo, tanto é que, ao construir sua casa, colocou em frente uma placa com letras garrafais: “Rua da Itália”. Ao sair de Simão Dias, vendeu sua casa e fez questão de constar na escritura a localização: “situada na Rua da Itália nesta cidade”. Apesar de seu intento, o nome não pegou e a rua continuou a ser conhecida como Rua dos Ribeiros, que na atualidade tem  a denominação de Júlio Manoel de Oliveira.

Enviei a redação pelo correio. Tempos depois, não sei se passados um ou dois meses, Messias Carvalho, que era funcionário dos Correios, entregou-me uma caixinha de encomenda com um chaveiro e um bilhete que me enviara o patrocinador do concurso, no qual agradecia minha participação e concedia-me, a título de consolação, um pequeno prêmio: um chaveiro com a gravura do Coliseu Romano.

Na época eu tinha 19 anos e vibrei com o consolo recebido. Ainda bem que me deram atenção!

Pelo visto, um sonho, um ligeiro diálogo com um antigo colega e o abrir de uma gaveta fizeram-me recordar de um prêmio, um notável psicólogo suíço, um desconhecido italiano e do meu conterrâneo Messias Carvalho que foi sacristão e trabalhava nos Correios e Telégrafos.

Isso é o que os entendidos denominam de sincronicidade ou conexão significativa.

Aracaju, 03/06/2024

Beto Déda