segunda-feira, 7 de março de 2016



“A PIADA DA SEMANA

Na última sexta-feira tive a grata satisfação de relembrar os bons tempos que trabalhei editando um jornal com meu pai. Foi em conversa com minha filha Carla e o genro Flávio, logo depois de um jantar no apartamento deles. Não é demais dizer, aqui, a minha alegria ao perceber em suas expressões o interesse e curiosidade pelos fatos que narrava.

De modo que, repasso para eles, e também para os que se interessam pela imprensa de nossa terra, as lembranças das xilogravuras feitas por meu pai e publicadas no jornal “A SEMANA”, por ele editado em Simão Dias, no período de 1946 a 1969. Foi o primeiro jornal em Sergipe a publicar uma seção de charges.

Naquela época, para impressão de imagens em jornais, as fotos eram gravadas em relevo sobre zinco. Tais chapas para impressão eram denominadas clichês. A gravação de fotografia em clichê era realizada em Aracaju, em um laboratório que ficava na Rua 7 de Setembro ou Vitória Torta e, anos depois, nas oficinas da Gazeta de Sergipe, do saudoso Orlando Dantas. Muitas vezes eu fui àquelas oficinas com fotos para gravação em clichês.

De ver-se que tal gravação não só demandava tempo como também era dispendiosa ($$$$$$).

Essas duas importantes dificuldades estimulam a criatividade. E foi assim que meu bom pai (José de Carvalho Déda) resolveu dedicar parte do seu passatempo em fazer xilogravuras. 

O meu velho era folclorista, gostava de folhetos da literatura de cordel, e foi nas capas desses folhetos que ele conheceu a xilogravura: técnica de entalhar na madeira a figura que se pretende reproduzir.

Nos idos de 1959, em seu ostracismo político, depois de atuar por doze anos (1947/1958) como Deputado Estadual, meu pai aproveitava seus intervalos nas lides advocatícias fazendo xilogravuras para ilustrar o jornal “A Semana”, por ele editado.

Para realizar o intento, ele já contava com a habilidade no uso de estilete, adquirida quando ainda era jovem, no corte de moldes de pelica para fabricação de sapatos. Mandou cortar pedaços de madeira (peroba rosa) com espessura igual ao da altura dos caracteres tipográficos, e, em maio de 1959, iniciou suas xilogravuras.

Com muita imaginação e humor ele desenhava a figura na prancha de madeira e, pacientemente, usando um estilete, desbastava a tábua, deixando gravados, em relevo, apenas os traços da caricatura.

Com essa técnica, seu Zeca Déda, como era conhecido em Simão Dias, fez mais de quatrocentas xilogravuras, publicadas no jornal “A SEMANA”.

As caricaturas satirizavam fatos políticos de repercussão local, estadual ou nacional e foram publicadas em uma seção denominada “A Piada da Semana”.


São antológicas as charges sobre a alta de preços, a falta de iluminação na cidade, a votação de cacareco e do bode cheiroso, as disputas eleitorais, caso diplomático entre Brasil e França (pesca da lagosta) e a força dos militares no poder.

Para aperfeiçoar seus cartuns, inventou um processo artesanal de impressão em três cores e publicou por um período as charges coloridas.

Também desenhou perfis de personalidades políticas e militares para ilustrar as notícias publicadas.

Mesmo depois do falecimento do saudoso chargista, ocorrida em 02 de setembro de 1968, o jornal “A SEMANA”, sob nossa direção, continuou com a seção “Piada da Semana”, republicando algumas de suas charges, registrando o pseudônimo (Zelis), por ele escolhido e expresso às vésperas de nos deixar.

Lamentavelmente, perdeu-se com o passar dos tempos as pranchas de madeira (xilogravuras) originais, que o seu autor denominava de ”clichês artesanais”.

Não obstante a perda das pranchas originais, evoquei a lição de criatividade do meu pai para preencher a falta. Então, com paciência, fotografei e guardo em arquivo virtual todas as xilogravuras feitas por ele e publicadas no jornal.

Assim é que, nesta oportunidade, apresento aos amigos que gostam de boas lembranças uma pequenina parte do meu acervo.

Aracaju, 29/02/2016

BETO DÉDA

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