O califom, a bolsa e o bolso
No primeiro
domingo deste ano levei meus netos para curtir a iluminação do Parque da
Sementeira, ornamentado em comemoração ao Natal.
Foi lá que avistei
aquela senhora corpulenta, de fisionomia simpática e respeitável, com cabelos
curtos, tingidos com um azulado bonito.
Aparentemente ela estava com os netos. Como a maioria das pessoas ali no
parque, ela também tirava fotos das crianças,
usando um celular. Fotografou à vontade e depois, para minha surpresa, puxou o decote da blusa e colocou a máquina dentro de seu califom. Amparou o
celular no calor de suas volumosas mamárias.
Lembrei-me então
que em minha terra era costume das matronas usarem o califom como bolso. Embora
atualmente o termo “califom” seja pouco usado, nos velhos tempos era assim que
se chamava a peça íntima que as mulheres usavam para sustentar os peitos. Hoje
é mais conhecido como sutiã. Outro dia ousei falar o velho termo e fui repreendido.
Os mais novos pensavam que era um palavrão.
Mas ao pensar no
uso do califom da simpática coroa, despertou-me três lembranças inesquecíveis
de bolsas e bolso (Em Simão Dias era comum usava-se também o termo algibeira
para designar bolso).

O bondoso pároco
nos abençoava, metia a mão no bolso e tirava uma bolsinha de couro marrom, que
usava como porta-níqueis, e nos presenteava com tostões. E a alegria tomava conta de nossa mente.
A segunda lembrança
foi a bolsa que o Broco da Usina
usava a tiracolo. Broco era o zelador
da Usina Elétrica, que ficava na Praça de São João, em prédio vizinho
à Cadeia Pública. A Usina fornecia energia para a cidade e era administrada por Seu Zuzu, um conhecido técnico em
mecânica.
O Broco parecia com a figura de Dom Quixote
desenhado por Gustave Doré (ilustrador da obra de Miguel de Cervantes: Dom
Quixote de la Mancha). Era surdo, magro, barba rala com cavanhaque, usava um
pequeno e surrado chapéu de couro e uma bolsa de pele de bode a tiracolo, onde
carregava miudezas, fumo, cachimbo e um canivete. Caçoávamos do enigmático
zelador, mas, ao vê-lo pegar a bolsa, corríamos pensando que ele estava sacando
o canivete para nos atacar. Medo sem
sentido, coisa de criança. O Broco não
fazia mal a ninguém. Usava o canivete para picar o fumo do cachimbo. Ademais
era surdo, não ouvia a pirraça da meninada.
A terceira
lembrança é a do bolso do paletó de meu pai.
Certo dia minha querida irmã Maura ganhou uma
bonita fita larga (antigamente as meninas usavam nos cabelos bonitos laços
de fita coloridas). Para guardá-la, Maura procurou um lugar que as demais irmãs não ousassem malinar. Foi então até o guarda-roupa do quarto de casal
e guardou a fita no bolso de um dos paletós de papai. Acontece que no dia seguinte meu pai usou justamente o paletó que
serviu de cofre para Maura.
À tarde, na sala
de visitas de nossa casa, meu pai estava conversando animadamente com seu
amigo, o Desembargador Gervásio Prata, quando, de repente, começou a espirrar. Incontinenti meteu a mão no bolso do paletó para pegar o lenço. Quando puxou, veio a
surpresa: ao invés do lenço estava a fita larga berrante. Aí então os dois deram boas risadas. Depois, na hora do jantar, meu pai
não perdeu a oportunidade de chamar Maura para justificar a hilariante
situação.
Daquele dia em
diante, a meninada da família não mais ousou guardar quinquilharias em bolso de
paletó.
Aracaju,
10/01/2016
Beto
Déda
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