Tourada no Matadouro de Simão Dias.
(Dedicado ao amigo Antônio de Manequinha)
Na tarde deste domingo, de minha
oficina no Lago Dourado, admirei a beleza do resplandecer do sol ao ver serenar uma
chuva fina que encharcou as folhas das plantações. Lembrei-me de meu pai
e de uma tourada que aconteceu no matadouro municipal de minha terra.
Não sei precisar o ano desta
minha lembrança. O que tenho certeza é que eu era muito novo, com idade de 8
e 10 anos, e que o fato aconteceu em uma
tarde de domingo, depois de uma ligeira chuva, como os raios de sol refletindo nos pingos retidos nas folhas
dos tamarindeiros da Praça de São João.
Parece até que estou a ouvir a
voz de meu pai chamando-me para ir ver uma tourada no Matadouro da cidade.
Fiquei deslumbrado com o convite e saímos pelo portão de fundos da casa em direção
a Rua do Curral.
Nossa casa ficava na Rua dos
Ribeiros. Era comprida, com quintal na parte dos fundos que fazia limite com a
Praça de São João. Ali meu pai tinha construído um depósito e um portão de madeira – que era fechado com uma tramela e reforçado
com um caibro atravessado no meio, seguro
por alças de ferro – que permitia o acesso à praça.
A Praça de São João ou Parque de São João era
o meu ponto de brincadeiras com os meninos que moravam nas proximidades. Por lá passava todo gado para
abate no matadouro municipal, que ficava perto, no final
da Rua do Curral, em cuja entrada avistava-se o oitão da casa de Seu Zé Neves.
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A entrada da Rua do Curral e (à direita) a casa que era do Seu Zé Neves (Foto recente de Google Maps) |
Naquele domingo o matadouro
mostrava-se limpo, gradearam a areia úmida do curral e, em redor da entrada, pequenos comerciantes improvisaram barracas para venda de guloseimas. Em uma delas vendiam torresmos, pipocas
e rapaduras. Lembro-me bem que meu pai
passou-me um pacote de pipocas e um tijolo de rapadura. Delícias para os guris
simãodienses.
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Final da Rua dol Curral - Local do antigo Matadouro (Foto recente do Google Maps) |
Em uma parte do curral, lembro-me bem, tinha um pano colorido, no formato de bandeira, colocado ali pelo homem com trajes surrados de toureiro. Até hoje não sei se aquela flâmula representava o México, a Espanha ou um país sul-americano.
Começou a exibição com a entrada
de quatro bois grandes e enfezados. Deixaram apenas o que parecia mais bravo e os outros foram retirados da arena improvisada.
Durante o espetáculo ecoavam gritos e aplausos. Mas a surpresa é que o pessoal aplaudia o enfezado touro. A torcida era contra o toureiro.
Debalde foram os gritos pró touro. O moço – que falava com sotaque – tinha o corpo ágil e sabia se desviar dos chifres afiados. Com seu pano vermelho fez o touro babar de cansaço e, aí então, levantava os braços, empinava o peito, tirava o gorro sujo de lama e pedia aplauso. E foi atendido e reconhecido como bom toureador pelo pequeno público sentado nas travessas de madeira do curral.
O touro não foi sangrado. Estava enfezado e, se abatido, a carne ficaria escura. Então deixaram para abater junto com o gado destinado ao preparo da carne de sol, que Seu Val (gerente de salgamento no matadouro) transportava em seu caminhão, às sextas-feiras, para vender nos mercados de Aracaju.
Debalde foram os gritos pró touro. O moço – que falava com sotaque – tinha o corpo ágil e sabia se desviar dos chifres afiados. Com seu pano vermelho fez o touro babar de cansaço e, aí então, levantava os braços, empinava o peito, tirava o gorro sujo de lama e pedia aplauso. E foi atendido e reconhecido como bom toureador pelo pequeno público sentado nas travessas de madeira do curral.
O touro não foi sangrado. Estava enfezado e, se abatido, a carne ficaria escura. Então deixaram para abater junto com o gado destinado ao preparo da carne de sol, que Seu Val (gerente de salgamento no matadouro) transportava em seu caminhão, às sextas-feiras, para vender nos mercados de Aracaju.
Durante vários dias a empolgante
tourada foi motivo de histórias pela meninada da Praça de São João.
E brincávamos, imitando
o toureiro e exclamando "Olé, tourôôôôô!”.
Ainda hoje, quando ouço o Passo Doble e a marchinha
de carnaval sobre toureiro, lembro-me da tourada que aconteceu no matadouro
de Simão Dias.
E lembrar coisas alegres não faz
mal a ninguém...
Aracaju, 18/07/2018.
BETO DÉDA
👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻
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