domingo, 9 de outubro de 2022

 

Meu irmão Carlos Eugênio...  

 

Os mais novos da família não conheciam o meu querido irmão Carlos Eugênio. Em vista disso, acredito que é importante registrar, aqui, instantes de nossa vida comum, que sempre estiveram em minha memória e que se tornaram constantes nestes últimos dias.

Carlos e seu diploma
do curso primário 
Carlos era mais velho que eu, a diferença de idade era pequena, apenas dois anos. Devido a aproximação de idade, Carlos foi o meu protetor e ponto de referência. Com ele participei de todas as brincadeiras de criança; era ele que me liderava e me protegia. E para garantir minha proteção, eu fazia questão de divulgar a sua força, seus socos fortes e certeiros e os cuidados que tinha com minha defesa. Era assim que eu intimidava os garotos mais fortes que me ameaçavam.  

Nosso primeiro nome era o mesmo: ele, CARLOS Eugênio; eu, Carlos ALBERTO. Em nossa família ele era conhecido como CARLOS e, para diferenciar, meus pais me chamavam de ALBERTO, especialmente o meu pai.  Os meus irmãos, pela lei do menor esforço, abreviaram e eu passei a ser conhecido na família como BETO.

Ele concluiu o curso primário em 1953, no Grupo Escolar Fausto Cardoso. Foi uma festa bonita realizada no Cine Brasil, que fora inaugurado naquele ano. O jornal A Semana divulgou a notícia da formatura (Ver foto abaixo).



Além da diversão, ele também partilhou comigo os trabalhos que fazia para reforçar sua mesada. Com ele fiz parcerias, tanto nas oficinas do jornal “A Semana”, como fazendo gaiolas de passarinhos ou ajudando no comércio de revistas. Ele foi o representante da Rio Gráfica Editora em nossa cidade e passou a comercializar as revistas e gibis daquela editora. Conseguiu um balcão com vidraças, colocou na sala da frente da redação do jornal e ali expunha as revistas em quadrinhos. Ele me incumbia de vender as revistas no cinema, pagava o ingresso e me dava gorjetas. Eu me encantava com esse trabalho porque via bons filmes e ainda tinha a primazia de ler, em primeira mão, todos os gibis. Foi folheando e lendo essas revistas que comecei a gostar de boas leituras e passei a desvendar os encantos dos livros da biblioteca de meu pai.

Naquela época, em nossa cidade não existia escola do segundo grau e isso frustrou os planos de estudo do meu irmão.  Calado e introvertido, traçou sozinho e cuidadosamente seu objetivo de vida e partiu para o sul do país; ele próprio cuidou de programar seu futuro.

Recordo-me, agora daquele tempo, do anoitecer do dia que antecedeu sua inesperada viagem. Depois do banho, ele passou a se barbear em frente a um espelho que ficava ao lado da cozinha da casa de nossos pais. E eu olhava admirado, acompanhando curioso seu modo de escanhoar os lisos pelos de seu rosto. Ele olhou-me com um sorriso bondoso que, até esta data, não saiu de minha conservada memória. E as lágrimas novamente se rebelam nessa pequena lembrança.

Ele devia ter 16 ou 17 anos quando, depois de uma viagem de trem cheia de padecimento e aventura, chegou à casa de nossos parentes no Rio de Janeiro. Acolheram-no o tio Gibson e o primo Sinito. Carlos passou a estudar e residir em um colégio que era do sogro de Sinito.   Serviu ao Exército e foi estudar na ESA (Escola de Sargentos das Armas) na cidade mineira de Três Corações. Se formou como Sargento Topógrafo.


Na primeira oportunidade, após sua formatura, fez uma visita a Simão Dias, e passou para todos os familiares uma alegria e orgulho indescritível. Meu pai irradiava felicidade e a visita foi registrada no jornal A Semana (v. abaixo).


Alguns anos depois da formatura, deu baixa dos serviços ao Exército e abriu uma firma de serviços topográficos.

Casou-se com a querida Zélia Biss Déda, com quem compartilhou toda sua vida. Do casal nasceram os filhos Júnior e Nuccia. O Júnior dedicou seus estudos à engenharia topográfica e passou a dirigir a firma fundada por seu pai. Nuccia é professora no Rio de Janeiro e herdou da família o gosto pela arte, faz belíssimas pinturas. 

Nos velhos tempos, quando não havia a facilidade de comunicação dos dias atuais, mantínhamos contato mediante cartas frequentes, em muitas laudas, com notícias de familiares e comentando a realidade brasileira, especialmente do nosso Nordeste. E, democraticamente, discutíamos nossos anseios e procurávamos pontos convergentes nas diferenças ideológicas. 

Estive no sul do país algumas vezes, visitando meu irmão em Ponta Grossa-PR, onde ele residia. Depois ele foi residir em São Paulo. Ele sempre vinha a Sergipe para rever os parentes e amigos. A última vez que por aqui esteve foi em 2019, quando fomos rever a nossa terra natal e abraçar os familiares. Agora percebo que foi uma visita de despedida.

Recentemente, em 23/09/2022, o inesquecível Carlos Eugênio fez a viagem final. Partiu para o lado da vida eterna. Seguiu o mesmo caminho da também amada irmã Zilda, que nos deixou recentemente, em 09/08/2022.  Amplia-se a dor da saudade quando lembramos que em anos recentes também partiram para mundo celestial os inesquecíveis Artur, Nancy e Malô. Ao lembrá-los, a saudade me faz sentir o correr de mornas gotas de lágrimas em minha octogenária face.

Carlos Eugênio era um homem íntegro, de pouco falar, mas de um coração imenso, com um forte sentido de justiça e uma moral cívica encantadora.

Carlos Eugênio: mais uma estrela no Céu. 


Neste instante, repito o que faço no silêncio dessas últimas noites insones: peço ao bondoso Deus que conforte a querida Zélia, a Júnior, a Nuccia e a todos os familiares. E que o Pai Eterno acolha o sempre lembrado e amado Carlos no reino celestial.

Até breve, meu irmão!

 

Aracaju, 09\10 \2022

Beto Déda


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