quarta-feira, 9 de janeiro de 2013


O uniforme de bancário e o incrível problema do uso de meias.

 
Em recente conversa com meu colega aposentado José Amâncio Neto, fui estimulado a escrever sobre as lembranças do tempo que trabalhei no Banco do Nordeste. Os causos são muitos, no entanto, ele e os amigos José Raimundo Araújo e Juarez Morais Chaves têm melhores condições para descrevê-los. Conheço-os bem e sei que lhes sobejam talento e conhecimento de nosso idioma e que eles já escrevem interessantes histórias dos velhos tempos.

Mesmo assim, aqui estão alguns fatos que transmito também para conhecimento de meus queridos netos, especialmente do pequenino Miguel, que não gosta de usar meias.




Minha nomeação como funcionário do BNB.
Comecei a trabalhar no BNB em 1965. Antes disso eu trabalhara como redator da Secretaria de Imprensa do Estado de Sergipe e como Oficial de Gabinete do Governador Celso Carvalho. Exonerado de meus trabalhos junto ao Governo do Estado, tomei posse na agência do BNB em Simão Dias, em 18.05.1965. Naquela época o gerente era o Luciano Cardoso, que além de bancário era um grande desportista. Estimulou o futebol de nossa terra e foi o principal articulador da construção de um campo de futebol que foi batizado com seu nome.
A gozação da folha de presença

 
No dia da minha posse fui acolhido pelos saudosos colegas José Carlos Macedo Déda e José Augusto Montalvão que me pregaram uma peça, uma espécie de trote para o bancário calouro: fizeram-me assinar em uma folha suplementar de presença do “Setor Avacalhado”. Ainda hoje guardo como lembrança a dita folha de presença assinada por mim e que também recebeu as assinaturas dos inesquecíveis colegas (Foto ao lado).

 

Funcionários da Agência do BNB
em Simão Dias nos anos sessenta
Naquele tempo, o banco era exigente na forma de vestir de seus funcionários: era obrigatório usar sapatos com meias, calça social, com cinturão, camisas de mangas três/quarto e gravata. Nos primeiros dias de trabalho, cedinho, lá estava eu sentado à mesa de minha casa, tomando café, quando meu pai, olhando-me cuidadosamente, indagou por que eu estava sem a gravata. Respondi que não estava esquecido e que faria uso dela no Banco, assim que ali chegasse. Meu pai balançou a cabeça, discordando de minha resposta, dizendo que se eu resolvera ser bancário teria de atender todas as formalidades exigidas pelo banco e me orgulhar disso. Assim, deveria sair de casa usando o traje de trabalho, de modo a evitar um possível esquecimento. Daquele dia em diante, até a minha aposentadoria, segui o conselho do meu pai.

O caso de uso de meias

Colegas do Setor Rural do BNB 
nos anos setenta (eu com um grande
bigode estou sentado à direita)
Muito tempo depois, lá pelos meados dos anos setenta, em uma determinada agência, presenciei uma situação difícil por que passou um colega que, por força de um problema momentâneo de saúde, não podia usar meias. Era um excelente funcionário da carteira rural e trabalhava sob minha direção. O gerente da Agência era exigente e muitas vezes implicava com os funcionários. Fazia confusão por questões insignificantes, razão pela qual passou a ser conhecido  como o espalha brasa. O fato é que, talvez sabendo da situação do colega, ele orientou o chefe do setor de pessoal a verificar quem não estava usando meias. Assim, por incrível que pareça, foi exigido que, antes de assinar a folha de presença, todo funcionário teria que levantar o pé e mostrar que estava usando meias. Um verdadeiro absurdo! O pior é que o bom colega chefe de serviços passou a ser chamado de cheira chulé.

Pois bem. Como era de se esperar, confirmado que um funcionário do meu setor estava sem usar meias, o gerente me chamou e determinou que eu exigisse o uso do uniforme completo, de modo a evitar o “corte de seu ponto”, ou seja, considerá-lo como faltoso ao serviço. Como já sabia do problema de saúde do colega, expliquei que se tratava de um benebeano excelente e produtivo, que estava com problema nos pés e que sua ausência traria prejuízos ao atendimento da clientela (era grande a quantidade de agricultores na agência naquele momento). E percebendo de que nada valeram minhas explicações, só me restou encarar o problema aplicando minha fórmula de resolver absurdos: neguei-me a acatar a decisão dizendo claramente:
"-Nem que a vaca tussa eu farei isso!”.

As faíscas daquela discussão escaparam da gerência e muitos ouviram o bafafá... A verdade é que depois desse entrevero deixou-se de inspecionar os pés dos funcionários daquela agência. E dei de ombros ao saber que o implicante iria comunicar à Direção Geral a falta de meias do colega e a minha decisão.

Passados alguns dias, estava eu substituindo o dito gerente quando tomei conhecimento de uma correspondência da Sede em resposta à informação dele sobre o assunto. Era um memorando escrito pelo próprio Chefe de Departamento de Pessoal (DEPES), cuja fonte da máquina de datilografia tinha a forma de manuscrito, que era sua marca registrada, conhecida em todo o banco naquela época. O memorando, curto e conclusivo, trazia apenas uma indagação esclarecedora, redigida mais ou menos nos seguintes termos:
“Será que essa gerência não tem assuntos mais importantes para tratar do que o uso de meias por seus funcionários?”.
Com o devido respeito à indagação do DEPES, mostrei o memorando aos demais colegas da Agência, inclusive, quando de seu retorno, ao titular responsável por aquela resposta. A reação dele? Nem queira saber. A minha, era de pura gozação...
 
Depois daquele incidente, nunca mais soube de exigência de uso de cinto ou de meia no ambiente de trabalho. Somente lá pelos anos oitenta é que o banco liberou o uso da gravata, que passou a ser exigida apenas para os administradores nas capitais, em ambientes com ar condicionado. Para mim, independentemente da exigência, seguindo a orientação de meu pai, continuei usando paletó e gravata até o dia de minha aposentadoria...

 Aracaju, 03/01/2013

Beto Déda

Um comentário:

  1. Boas lembrancas meu caro Beto. Naturalmente todos sabemos que foi o Gerente! Sao muitas historias sobre as exigencias que o mesmo fazia!Conte mais!!!!

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