segunda-feira, 8 de maio de 2017

A TEORIA ARGUMENTATIVA E OS FILÓSOFOS SIMÃODIENSES.

Nas últimas semanas estive longe das redes sociais. Passei alguns dias em Salvador e, no final do mês de abril, me dediquei a outras atividades que me lançaram longe da rotina.
Mesmo assim, não deixei de reservar algum tempo para uma boa leitura e não fiquei indiferente às proveitosas manifestações do dia 28 de abril, quando o povo foi às ruas manifestar sua discordância às lastimáveis reformas que o governo golpista e seus aliados tentam empurrar goela abaixo das classes menos favorecidas do país.
Nas minhas recentes leituras, deparei-me com um artigo publicado na revista Carta Capital, edição de 19/04/2017, escrito por Thomaz Wood Jr., Professor da FGV-EAESP, que comenta sobre a Teoria Argumentativa do Raciocínio, defendida por dois cientistas franceses (Hugo Mercier e Dan Sperber). Eles contestam o legado do filósofo René Descartes (1596-1650), considerado como o pai da filosofia moderna. Para melhor lembrar, Descartes era conhecido pela frase em latim: “Cogito, ergum sum”, ou seja, “Penso, logo existo”.
O tema abordado por Wood me interessou. E fui motivado pela lembrança que me transportou para o tempo de minha juventude, quando me animava em leituras nos compêndios da pequena e importante biblioteca de meu pai. Foi lá que pela primeira vez deparei-me com um exemplar do Discurso do Método, de Descartes. Li com entusiasmo e fazia questão de comentar com colegas e parentes próximos. O lema de Descartes era a busca da verdade e, para alcançá-la, recomendava se duvidar de tudo, fazendo indagações de modo a excluir qualquer parcela de incerteza.
Ao ler o artigo de Wood Jr., apressei-me em conhecer o que alegam os atuais contestadores do pensamento de Descastes. E eles apresentam argumentos importantes em defesa do que chamam Teoria Argumentativa, informando que o raciocínio e a razão não buscam a verdade, mas procuram sistematicamente argumentos que justifiquem nossos pontos de vistas ou ações.   Trocando em miúdos: eles asseguram que a capacidade de raciocinar é desenvolvida para permitir a interação social, de modo a defender nossas crenças e convencer outras pessoas a aceitarem nossos argumentos. O raciocínio adota o viés da confirmação: selecionando arrazoados que favoreçam nosso modo de pensar, desprezando os que lhe são contrários, independentemente de serem válidos.
Embora a Teoria Argumentativa seja motivo de discussão acadêmica, envolvendo controvérsia entre filósofos e psicólogos, o assunto fustigou minha memória para o tempo em que me dedicava a analisar com carinho a filosofia de simãodienses pensadores. 
E seguindo a máxima do grande Millôr Fernandes de que “Pensar-livre é só pensar”, dediquei-me a matutar sobre a Teoria Argumentativa envolvendo livres pensadores simãodienses, envolvidos em problemas metafísicos do torrão margeado pelas águas salobras que descem pelas curvas assimétricas do riacho Caiçá.  
Lembrei-me, então, de consagrados e conhecidos "filósofos" conterrâneos que esbanjavam argumentos para favorecerem seus pontos de vista. Encantava-me perceber o raciocínio de Domingos Bina, Negão Engraxate, Paulo José dos Santos, Avião e a garota Bolochinha. Todos eles apresentando argumentos fartos em defesa de seus interesses e ideais: o carnaval, o bom aguardente, a beleza de seus amores e suas preferências expostas; tudo sem preconceito, nem cor.
Eram livres pensadores e filósofos capa-bodes, que neste momento reluzem em minha memória e os vejo como exemplos da Teoria Argumentativa defendida pelos franceses Mercier e Sperber.
Dentre os lembrados filósofos simãodienses, ressalto aqui os argumentos expressos por Paulo José dos Santos, em seus longos e contundentes discursos que começavam na Rua da Palha, por trás do antigo Açougue Municipal. Ali, no início das noites de sábado, depois de tomar muitas biritas no Bar de Seu Júlio, o Paulo José dos Santos começava seus discursos famosos, demonstrando sua verve de orador e apresentando argumentos em defesa de seu gosto pela saborosa aguardente. Em todos seus discursos evidenciava a pureza dos barris de cachaça, procedentes dos engenhos de Laranjeiras, pendurados em cangalhas de mulas que desciam a Serra do Cabral, em comboios tangidos por tropeiros e que se dirigiam ao Norte, Sul, Leste e Oeste da cidade para benzer as gargantas secas dos bravos trabalhadores simãodienses.  E repetia sem cansar os pontos cardiais da cidade e os elogios à cachaça pura dos alambiques do Vale do Cotinguiba. Grande orador, excepcional bebedor. 
Mas deixemos de lado os populares pensadores da terra natal e passemos à realidade do que representa a teoria desenvolvida pelos professores franceses.
Pelo que se tem notícia, a teoria argumentativa saiu da raia dos advogados e, nos dias conturbados que atualmente assolam nosso país, tem sido venerada por parte de componentes do Poder Judiciário. O que se nota é que alguns procuradores e juízes não estão preocupados em raciocinar em busca da razão e da verdade. O interesse maior é a procura de argumentos que consolidem seus pontos de vista e suas ideologias. Agem despudoradamente e tomam decisões seletivas, usando meios duvidosos de pressão para conseguirem argumentos que respaldem suas preferências.
Quem são eles?
A resposta, como costuma dizer o Mino Carta: “é do conhecimento até do Mundo Mineral”.
Por esta e outras razões, dou um forte grito de VIVA aos "filósofos" simãodienses, que em outras eras praticavam sem preconceito a teoria argumentativa. Só que de forma mais clara e honesta do que a de alguns atuais e parciais julgadores.
ARACAJU, 07/05/2017
 BETO DÉDA

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