O BNB, o Cometa
Kohoutek, a imprensa “marrom e o fim do mundo...
Recentemente, ao comentar sobre uma fotografia no facebook, o colega Moacir Néri usou o termo MODéda, o que me fez recordar do tempo que trabalhei no
Banco do Nordeste do Brasil, órgão conhecido na região como BNB(bê-ene-bê) e os seus funcionários eram
chamados “benebeanos”. Diziam os colegas que eu tinha uma memória fotográfica,
que conhecia com detalhes todos os clientes e que sabia decorado o Manual de
Operações de Crédito do BACEN (MOBacen) e o Manual de Operações de Crédito
Rural do BNB (MODERUR). Certamente era um comentário exagerado. Na verdade meu
trabalho exigia sempre a leitura daqueles manuais, e isso e me dava um bom
conhecimento das operações bancárias. Daí a razão de alguns colegas como o
Moacir me apelidarem de MODéda.
Guardo boas recordações do tempo do BNB. E aqui vai uma delas. No ano de
1973 eu trabalhava em Simão Dias, minha terra natal, onde aconteceu um fato
curioso que narro para conhecimento de minha querida neta Marina, que começa a
decifrar meus escritos.
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Foto do Cometa Kohoutek tirado em janeiro de 1974 e publicado pela Wikipédia-Enciclopédia livre |
No final daquele ano a imprensa mundial cuidava da notícia do Cometa KOHOUTEK, assim chamado em homenagem ao
seu descobridor, o astrônomo checo Lubos
Kohoutec. Anunciava-se que aquele seria o “cometa do século” e que apresentaria uma visão surpreendente, de
beleza inigualável, seria um verdadeiro espetáculo celeste, bem maior do que
aconteceu com o Cometa Halley, no início do século XX. A imprensa
sensacionalista ou “marronzista” – como dizia o Odorico Paraguaçu, personagem
de Dias Gomes – anunciava que o Kohoutek
entraria em choque com a Terra e tudo explodiria. Seria o fim do mundo! Com sói
acontecer, os delírios da imprensa marrom favoreceram os especuladores, e estes,
pensando em maiores lucros, também propagavam com detalhes a suposta catástrofe,
incentivando a ação precipitada dos crédulos.
Eu era o chefe do setor de crédito rural do BNB em Simão Dias, uma das
maiores agências do polígono em financiamentos para agropecuária. Não esqueço
um fato que ocorreu com uma cliente do município de Pinhão. Ela era uma senhora
viúva que impunha respeito não só pela idade, mas também pelos princípios religiosos
que defendia e pelo seu porte de trabalhadora incansável. Era uma cristã fervorosa
que cuidava com muito esmero e honradez da educação de seus filhos e de sua
pequena gleba rural. Certa manhã ela apareceu na agência e pediu-me para
calcular o saldo devedor de seu financiamento de longo prazo, para efeito de
pagamento antecipado. Surpreendido,
indaguei porque motivo pretendia pagar antecipadamente um financiamento
resgatável em cinco anos, com juros fixos de 7% ao ano, sem qualquer outro
encargo, cujas prestações, no futuro, seriam de valor insignificante. E a senhora, olhando-me nos olhos, disse-me,
mais ou menos, o seguinte: “Seu Beto,
ouvi no rádio que o mundo vai acabar! Me disseram que ainda este mês uma tal estrela
‘corruteque’ vai cair na Terra e destruir tudo. Não quero ter o pecado de saber
que vou morrer logo, deixando dívida. Uma boa crista não morre devendo. Vou
vender tudo e pagar ao banco...”
Era o efeito da imprensa “marronzista”
e de aproveitadores do Cometa Kohoutek
influenciando uma crédula sertaneja. Foi preciso muita conversa e argumentos
para convencer aquela honesta e inocente trabalhadora a evitar a venda de seus
bens e antecipar pagamentos. Com muito esforço ela resolvera aguardar alguns
dias, o que foi suficiente para desmascarar a falácia do Cometa e livrá-la de
prejuízos. Pouco depois, foi divulgado que os cientistas já sabiam, com
antecedência de mais de dois meses (desde outubro de 1973) que o Kohoutek não era nada daquilo que fantasiosamente
publicavam. Tudo não passou da imaginação fértil da imprensa marrom e que
repercutiu no pensamento religioso de uma lavradora do interior de Sergipe.
O Cometa do Século passou a ser
conhecido como o “Fiasco Sideral do
Século”. E os sertanejos, sem esconder o contentamento, diziam: “- O Cometa ‘corruteque’ deu chabu, broxou!”...
Aracaju, 28/09/2012
Beto
Déda
Muito legal esta história meu caro Beto! Sua memória continua fantástica. Espero que você conte outras, principalmente envolvendo colegas do BNB dos idos de 1967 a 1972, período em que trabalhamos juntos na Agência de Simão Dias. Vou aguardar. Abr.
ResponderExcluirBondade sua, amigo Amâncio. Contarei outras histórias oportunamente. Um abraço.
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