domingo, 14 de dezembro de 2014


O Doidinho e o canto a Sá Mariquinha.

Em recente encontro com familiares, dizia uma querida sobrinha que nossa memória guarda acontecimentos como se fossem filmagens e vez por outra vêm à tona, como flash, inesperadamente. É verdade!

Sempre gostei de cantar no banheiro. E esta semana estava debaixo do chuveiro agitando minha voz quando de repente, como um flash iluminando minha memória, passei a cantarolar os versos de um menino doidinho que morava em Simão Dias, lá pelos anos cinquenta.

Pois bem. Se vocês tiverem paciência, contarei as lembranças que tenho do doidinho e a cantiga a Sá Mariquinha.

Ele era um garoto que aparentava 16 anos e, no máximo, não passava dos 18. Não girava bem da cabeça, era maluquinho mesmo. Tinha o rosto marcado pelo sol, que deixava marcas de sardas em sua pele branca. Cabelo curto, liso e despenteado. O nariz empinado, a boca sempre fazendo biquinho ou mostrando a falha de um dente frontal.

Andava pelas ruas, sempre fora das calçadas, seguindo as valas de escoamento de águas, em passos rápidos e largos, cantarolando seus dizeres em ritmo. Se estivesse de bom humor, seu canto era simples, alegre e sem escândalo. Mas quando o juízo ficava quente e confuso, não pestanejava em acelerar o seu louco andar, transportando para seus versos palavras de baixo calão.

A cantiga preferida dele era a que invocava uma tal Sá Mariquinha, para pedir linha.

De então até hoje, não descobri quem era a Sá Mariquinha e porquê ele queria linha.  Algumas pessoas da época arriscam a sugerir que Sá Mariquinha era uma costureira da cidade que o Doidinho pedia linha para empinar arraia. Não tenho certeza disso.

O certo é que ainda hoje me lembrei de alguns trechos de seu repertório. Um deles era cantarolado quando ele estava calmo e dizia o seguinte:

- Sá Mariquinha, eu quero linha, eu quero linha! Pularam minha cerca e roubaram três galinhas; uma era branca e duas pretinhas...”

Quando, porém, estava com o juízo confuso, com mau humor, seus passos aumentavam, e quase correndo, pisoteando com força as águas que desciam pela sarjeta, olhava para os transeuntes com seu nariz fino empinado e cantarolava:

- Sá Mariquinha, eu quero linha, quero linha! A pica é do galo e o xibiu é da galinha...

Nesse seu cantar de protesto, a entonação que ele dava às palavras chulas causava riso geral e faziam as puritanas torcer o nariz, dizendo-se escandalizadas.

Eta Doidinho de rima porreta!
Aracaju, 03/11/2014
Beto Déda

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